Amigos do jazz + bossa

quinta-feira, 2 de julho de 2009

INIMIGOS: UMA PEQUENA HISTÓRIA DE AMOR AO JAZZ


A música que os ocupantes do pequeno palco tocavam era alegre, exuberante como a bela vocalista que os acompanhava. Mas as poucas pessoas que ousavam permanecer naquele enfumaçado recinto não pareciam nada felizes. Estavam silenciosas, indiferentes. Os rostos taciturnos denunciavam os tempos difíceis por que passavam. Alguns tomavam cerveja, outros, vinho barato. Ninguém cantava ou dançava. Alguns acompanhavam aquele ritmo inebriante com um sóbrio manear de cabeça ou um discreto estalar de dedos, mas não pronunciavam palavra alguma.


Embora as músicas soassem familiares, ao final de cada uma delas a cantora anunciava o respectivo título em francês mas, curiosamente, parecia que alguma coisa não se encaixava. No meio do set, alguns homens entraram com estrépito no bar. Vestiam uniformes impecavelmente alinhados. As botas, muito bem engraxadas, brilhavam. Muitos exibiam, com indisfarçável orgulho, incontáveis medalhas e galardões. Nos coldres, todos portavam mortíferas pistolas Luger, das quais somente se podiam ver os cabos. Nas cabeças, os quepes tornavam os integrantes daquele grupo insuportavelmente arrogantes.


Alguns gargalhavam acintosamente, outros cantavam em um idioma incompreensível. Pediram cerveja e o melhor vinho do lugar. Sentaram-se em uma mesa bem afastada do tablado, expulsando dali um homem franzino e de aparência humilde que até então tomava, apático, uma minúscula taça de vinho, e continuaram a sua ruidosa algaravia. Nenhum deles parecia prestar atenção aos demais fregueses do bar, menos ainda à música que enchia o ambiente com uma injustificável alegria. Exceto dois.


Um deles era exatamente aquele que parecia ser o líder do grupo e o mais engalanado deles. O outro era um oficial de patente visivelmente inferior. O olhar do primeiro era severo, cortante, de um azul tão intenso que parecia entranhar-se na alma da pessoa a quem se dirigia. O segundo, que ostentava poucos galardões e era, por certo, o menos graduado daqueles oficiais, observava o desempenho dos músicos com um olhar embevecido, como se quisesse manter com cada um deles uma proibida cumplicidade.


O violinista sentiu enregelar a espinha, mas continuou tocando, tentando ignorar o terror que o olhar do oficial mais graduado lhe incutia. Quanto mais os músicos exibiam a sua técnica refinada e se esmeravam em dar suporte ao canto hipnótico da vocalista, mais intensa era a força daquele olhar inquisidor. Tocaram ainda por uma hora, quando o espetáculo, finalmente, se encerrou. Desceram do palco e o líder do grupo fez um sinal – discreto, porém enérgico – ao assustado violinista. Perguntou, em francês e com um tom que denunciava alguém acostumado a dar ordens e, certamente, jamais vê-las desobedecidas:


- Qual o nome da música com que vocês encerraram a apresentação?


O violinista, hesitante, respondeu:


- É “Tristesse De Louis XV”, senhor.


O tom de voz do jovem instrumentista, entre assustado e ansioso, denunciava que algo estava errado. De fato, vivia-se o tenebroso período da invasão alemã à França, durante a Segunda Guerra Mundial. Aos franceses era terminantemente proibido tocar música americana. O estratagema usado para enganar os alemães era simples, mas um tanto quanto perigoso: os músicos tocavam canções americanas com letras em francês, modificando, inclusive, os seus respectivos títulos. “Tristesse De Louis XV” não era outra senão a clássica “Saint Louis Blues”, de W. C. Handy, e caso fossem descobertos, os músicos poderiam até mesmo ser presos.


Em todo caso, o oficial balançou a cabeça levemente e pareceu satisfeito, pois a letra falava dos amores do célebre monarca francês. Pouco tempo depois o grupo se levantou da mesa e se dirigiu à saída. Ninguém pagou um único centavo pela comida ou pela bebida ali consumidas. Todos saíram do recinto, exceto o oficial menos graduado, aquele que permanecera o tempo inteiro a observar com atenção o espetáculo. Calmamente, dirigiu-se ao violinista e disse, também em francês:


- Parabéns pelo espetáculo. A que mais gostei foi “Saint Louis Blues".


O violinista ficou petrificado, imaginando que ele e os demais músicos sairiam dali diretamente para a cadeia. O terror congelou-lhe a fala e ele permaneceu calado. Com um discreto sorriso, o oficial completou:


- Não tema, só queria cumprimentá-lo. Eu sou pianista de jazz e de forma alguma iria denunciar um colega de profissão.



*****************************


Jamais se saberá quem foi aquele oficial alemão que preservou o segredo dos assustados músicos, evitando que eles passassem uma temporada nas terríveis prisões alemãs. Mas o violinista passou à posteridade como um dos três maiores nomes do instrumento no jazz e o mais longevo deles: Stéphane Grappelli (os outros dois são Stuff Smith e Joe Venuti). Fundador do célebre Hot Club de France, ao lado do fenomenal guitarrista Django Reinhardt, Grappelli foi um dos mais importantes nomes do jazz europeu e viveu de perto as agruras da Segunda Guerra Mundial, quando os alemães tomaram a sua adorada Paris.


Em sua monumental carreira, tocou alguns dos maiores jazzistas, em uma relação que inclui Duke Ellington, Oscar Peterson, Joe Pass, Kenny Clarke, Coleman Hawkins, Mel Lewis, Gary Burton e McCoy Tyner. Em 1969 gravou, pela primeira e única vez, ao lado de outro mestre do instrumento, Joe Venuti, o excelente “Venupelli Blues”, para a Charly. O repertório do disco é composto por seis standards, recriados com a elegância e o bom gosto típicos dos líderes da sessão. Como um charme a mais, o disco foi gravado em Paris, onde se passou a história acima.


Acompanhando estes dois gigantes, um outro músico da mesma estatura, o notável Barney Kessel, assume a guitarra. Os demais integrantes do combo são o pianista George Wein (o lendário criador do Festival de Newport), o baixista Larry Ridley (um habilidoso sideman, cujo talento pode ser apreciado em discos de Lee Morgan, Freddie Hubbard, Roy Haynes e Red Garland) e o baterista Don Lamond (outro músico pouco conhecido, egresso da orquestra de Woody Herman mas com um currículo fenomenal, que inclui gravações com Charlie Parker, Stan Getz, George Russell e Zoot Sims).


Todas as faixas primam pela excelência, mas há pelo menos dois destaques absolutos: “After You’ve Gone” e “Tea for Two”. A primeira começa bem relaxada e depois vai evoluindo para um diexeland bastante acelerado – além do belíssimo trabalho dos líderes, o piano stride de Wein e o delicado fraseado de Kessel exigem do ouvinte uma atenção redobrada. Na segunda, o maravilhoso duelo de violinos, com cada um dos líderes tocando como se fosse a última gravação da qual participariam. Sob todos os aspectos, uma gravação notável, que dignifica as biografias de todos os envolvidos e que deve figurar com destaque nas estantes de qualquer jazzófilo.



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PS.: Post dedicado ao querido mestre José Domingos Raffaelli, que contou aqui mesmo no JAZZ + BOSSA, a deliciosa história que inicia esta resenha, em um comentário feito sobre o disco “Afternoon In Paris”, de John Lewis e Sacha Distel.

32 comentários:

Sergio disse...

Érico, te respondi lá no sônico, assim q puder d um pulo, um pulinho, um intantinho no 'bar' q tem um recado lá.

Nova postagem, é?... Ê sacrifício!...rs... Mais um texto elementar, meu caro, pra ler... E + um disco q não possuo... Q capa linda... Joe Venuti? Tenho apenas uma música numa compilação... O q significa q, em gostando, vou ter q caçar parte da obra...

Vcs (Lester + Salsa) estão me dando uma vida muito estafante, sabe...?
Prejudicado abraço...

Érico Cordeiro disse...

Caro Sônico,

vou dar uma lida no e-mail e te respondo. Desculpa a demora. E, se depender de mim, você vai ficar cada vez mais "estafado"..
Abração!

Salsa disse...

O violino não é um instrumento que me seduz. Os excelentes músicos não conseguem me fazer ouvir duas vezes o mesmo disco. Minto, tem um de Grapelli com Peterson que eu escuto de vez em quando.
Contudo, ouvir a seleção lendo o texto foi um agradável momento. A narrativa, acrescida da trilha sonora, fez-me imaginar um velho filme de suspense/espionagem/noir.

Sergio disse...

Minha cultura cinéfila até q não é má, mas a ligação mais óbvia com Casablanca foi imediata. Muito bom texto, Érico. E violinos e acordeões (q não veio ao caso aqui), no jazz, pra mim são muito bem vindos.
Abraços revigorados!

Érico Cordeiro disse...

Ô, Seu Mr. Salsa,
O Grappelli é muito bom. Tenho dois discos dele com o Petersen, que são marevilhosos. Também muito bacanas são o Tivoli Gardens, com Joe Pass e NHOP e o songbook do Cole Porter (com músicos franceses).
Tem um moço da nova geração que também é ótimo, o Christopher Howes, muito bom mesmo!!
Violino também não é dos meus instrumentos prediletos no contexto jazzístico (assim como a flauta, a gaita e o acordeão). Mas aí quando entra a genialidade de um Grappelli, de um Frank Wess, de um Toots Thielman, de um Richardd Galliano, até que dá prá passar o dia todo ouvindo.
Abração!

Érico Cordeiro disse...

Seu Mr. Sônico,
Já tinha postado o comentário acima quando vi o seu comentário. Obrigado pelas palavras gentis e repito o que diss antes.
A analogia com Casablanca é beem legal (confesso que não tinha pensado nisso antes).
Abração e estou "matutando", viu?!?!?!

Celijon Ramos disse...

O violino é instrumento que exige muito cuidado na execução. Principalmente, quando é utilizado na linguagem do jazz. São necessários verdadeiros cracres com os escolhidos por ti neste post para se evidencie suas possibilidades de uso no jazz. Endosso as palavras de Salsa ditas acima.

Um abração, querido.

Érico Cordeiro disse...

Celijon,

Que bom lê-lo por estas bbandas. Concordo com você - e quando estiveres garimpando na rede, procura o Christopher Howes.
Um beijão!!!

figbatera disse...

Érico, o "show" de jazz tem estado ótimo, mas quando virão a "bossa + baratos outros"?

Sergio disse...

Essa foi ótima, Olney! Aliás, é Fig ou Ney?

Érico Cordeiro disse...

Caro Fig,
Pois é, quando criei o blog, aidéia era exatamente essa - ser uma casa "eclética", na melhor acepção da palavra. Tanto é que a primeira postagem foi sobre o disco Clube da Esquina II. Acontece que, como bem disse o Sônico, o "bichinho" do jazz me pegou de tal maneira que não tenho conseguido escrever sobre outros estilos. Mas vou tentar, ok? Já tenho alguns discos bastante postáveis, clássicos da bossa nova/samba jazz dos anos 60, sobre os quais em breve haverá de pintar algo.
Enquanto isso, espero que você não enjoe do jazz, ok?
Um afetuoso abraço - e seu Sérgio, acho que é FigOlney, prá rimar com Siboney - a belíssima rumba de Ernesto Lecuona, gravada por Stan Getz e Dizzy Gillespie!!!

John Lester disse...

Prezado Mr. Cordeiro, creio que o senhor apreciaria o filme O Pianista, dirigido por Roman Polanski e com roteiro baseado em obra autobiográfica de Władysław Szpilman. Por certo, não há jazz, mas emoção suficiente para várias horas de reflexão: o poder do piano se sobrepõe ao da metralhadora?

Creio que sim. Grande abraço, JL.

Érico Cordeiro disse...

Caro Mr. Lester,
Possuo esse DVD (foi lançado em um pacote duplo, juntamente com o também maravilhoso "O paciente inglês"), mas ainda não assisti - ele está separadinho, aguardando prá ser visto, junto com os recomendados "Babel" e "Boa noite e boa sorte".
A dificuldade é que quando ponho um filme, aparecem dois meninos maluquinhos (o Davi e o Guilherme) pedindo prá pôr Bob Esponja ou Ben 10, o que tem dificultado um pouco o meu lado cinéfilo (rs, rs, rs).
Mas pelo menos eles adoram jazz (ou, como diz o Davi, "zézi")!!!!
Um grande abraço.

Sergio disse...

“Zézi”! O muleque: "pô pai, tira esse balão mágico e põe um zézi aí."

Isso é que eu chamo boa criação. E antes de ferir suscetibililí, só pra continuar na língua do tatibitati, nada contra. O Balão foi bom pra garotada, mas se eu cito Xuxa aí mesmo q alguém sai ofendido.

Babel foi um dos melhores filmes que vi no ano de seu lançamento. Só uma coisa prática sobre o filme: nem tente adivinhar o q acontece na seqüência seguinte. Simplesmente não irá acontecer.

O Pianista tbm é genial! O Lester disse tudo sobre o poder dos acordes sobre ratatatá dos infelizes.

Mas este Venupelli Blues aqui, amigo... É muito classudo! E depois... Rarezésimo, meus caros! Sabe quanto está custando no site do Amazon? 143 verdinhas e 19 cents. Vejam:

http://www.amazon.com/Venupelli-Blues-Grappelli/dp/B000003655/ref=sr_1_1?ie=UTF8&s=music&qid=1246645836&sr=1-1É o que eu digo

Não. Como bom protetor dos animais não mataria a cobra, mas deduraria o pau na mão do assassino potencial.

É o que eu digo, repito e se alguém quiser discutir, treplico! Na impossibilidade minha, óbvia, da compra, quem vai me obrigar a não ter? E quantos abastados (espera-se com prazer) estão aptos a pagar uma fábula dessas por um disco? Aqui ó!

Valeu, Érico!

Érico Cordeiro disse...

Caro Sônico,

Quer dizer que o bichinho tá esse preço? Pô o meu foi baratinho, baratinho - edição nacional da Paradoxx, comprei sem grandes expectativas e PIMBA!!!! Fiquei amarradão.
Um abração, meu caro - e mandei uma msg. prá você!!!

Érico Cordeiro disse...

Caro Sônico,

Quer dizer que o bichinho tá esse preço? Pô o meu foi baratinho, baratinho - edição nacional da Paradoxx, comprei sem grandes expectativas e PIMBA!!!! Fiquei amarradão.
Um abração, meu caro - e mandei uma msg. prá você!!!

Sergio disse...

Pois não é o que estou dizendo, caro Érico?... Deixei o endereço para a confirmação sua e dos demais. Geralmente descubro q um disco é raro na hora de baixar. O processo é simples: uso o soulseek q é um kazaa q deu muito certo, e ali, dificilmente não se encontra o q se procura. Quanto menos usuários tem o arquivo/album (por ex. um Thriller do MJ chega a dar tilt no soulseek de tanta oferta), mais raro o disco é. No caso deste havia apenas 1 único "user". Daí, baixado o disco, vou em busca de mais informações a começar pela capa e quando não se encontra muitas opções de imagens de capa, é batata q o bichinho é uma raridade. No caso desse, nem está a venda no Amazon - sinal d q está fora de catálogo - são dois pessoas físicas particulares, q puseram o disco hospedado lá, um a 143, outro a 169 doletas! Tá tudo lá. Maravilha, né? Sua "pechincha" de ocasião transformou-se num raro objeto de colecionador.

Já vi teu emeio e respondi, grato pela força!

Érico Cordeiro disse...

Valeu, Seu Mr. Sérgio,
Um abração!

pituco disse...

érico,
não abrirei trincheiras em defesa disso ou daquilo, aqui nesse sítio pra lá de piramidal...

tudo o que vier é virtual...e vem bem...tudo o que se ler,ver e ouvir é informação.

sou a favor da internet livre...downloads gratuítos de áudios...é isso aí.

que lance mais tacanho...proibir-se a divulgação da obra por motivos políticos, econômicos, raciais e pseudo-autorais...rsrsrs...como nessa passagem de tua resenha.

stravinsky foi simpatizante nazista...mas e daí?...sua(a dele)música extrapola esse fato mundano,não achas?

valeô o post sempre impecavelmente redigido

abraçsonoros
namaste

Érico Cordeiro disse...

Caro Pituco,

Também acho que a arte não pode ser censurada (taí o nazismo, o fascismo, o comunismo e tantos ismos que tentaram e ainda tentam podar a arte).
Também acho que a grande arte, aquela que fica, não deve ser confundida com a coloração ideológica do seu autor. Celine foi um escritor genial - seu livro Viagem ao fim da noite é excepcional, mas o sujeito tinha um péssimo caráter (foi um célebre colaboracionista na França ocupada).
Não tenho o menor pudor em ler/ouvir/assistir livros, discos ou filmes de sujeitos que pensam diferente de mim. Adoro Borges e Nélson Rodrigues, apesar de não comungar das mesmas convicções ideológicas desses grandes escritores.
Um grande abraço do lado de cá do planeta.

Sergio disse...

Nelson Rodrigues mais do que justificou ser brilhante como foi e pensar como pensava.

Ao rever o passado, costumamos nos esquecer que os tempos são outros.

Meus amigaços de sempre, da época da faculdade, me consideram um reaça, só pq não perco uma oportunidade de desancar o ídolo máximo deles, o Lula... Para mim estão todos à ex-querda no tempo e no espaço.

E para continuar no presente, considero o Cony dos maiores escritores brasileiros. Parafraseando o prof. Raimundo, 2º as más línguas, mas o caráter ó...

O que dizer do Nobel autor de insuspeitas simpatias nazitas mas de humaníssima obra, "Fome": Knut Hanson?

Mas voltando ao assunto q mais me ocupa - amanhã, quem me garante que não? -: possa estar na surreal situação de uma moça americana, condenada a pagar muito mais de milhão de dólar por ter baixado 24 músicas da internet? Vcs viram essa no Jornal Nacional?

... Espero q os amigaços de ex-querda não se esqueçam de mim, afinal precisarei deles pra levar-me uns maços de cigarro no cárcere.

Por isso, fico garrado à idéia de "abrir trincheiras", afinal, assim como um malfadado presidente gostava de dizer q tinha aquilo roxo, eu q me considero o posto em ética e caráter, tbm possuo em mim aquilo q pisca.

Ai, eu e essa maldita mania de fazer piada com coisa séria!

Sergio disse...

errata: "eu q me considero o oposto"

Érico Cordeiro disse...

Seu Mr. Sônico,
A arte tem dessas coisas. Muitas vezes a obra tem muito pouco com o caráter do artista. Taí o glorioso Miles Davis que não me ddeixa mentir!!!!
Mas não se preocupe com o cárcere. Seus motivos são os mais nobres possíveis. Depois, o maravilhoso Graciliano Ramos escreveu ali uma de suas obras mais arrebatadoras (rs, rs, rs).
E você foi longe ao lembrar do cidadão que nasceu com "aquilo roxo".
Abração!

Marta Bellini disse...

Que música linda!

Grata por sua visita e por me indicar sua bela "praça".

Bjus
Marta

Érico Cordeiro disse...

Cara Marta,
Seja muito bem vinda e sinta-se em casa. Como pode ver, este espaço virtual é uma casa de amigos (alguns, inclusive, são habituais visitantes do seu ótimo blog).
Faço a mais absoluta questão de vê-la sempre por aqui (nem precisa dizer que me esbaldo com as deliciosas charges do seu blog) e, por favor, quando decidir aceitar o conselho do grande Mr. Lester acima (de escrever sobre jazz), estaremos prontos para devorar com avidez os seus textos.
Um afetuoso abraço e muito obrigado!

José Domingos Raffaelli disse...

Érico,

Há anos li uma história muito interessante e comovente ocorrida na época da Segunda Guerra mundial, que há tempos transcrevi na coluna semanal que escrevo no jornal Folha da Estância. Como penso que ela tem muito em comum com o relato da sua resenha, tomo a liberdade de transcrevê-la:

- JAZZ EM TEMPOS DE GUERRA –

O conflito entre os aliados e os países do Eixo lembra-nos um episódio emocionante ocorrido no campo de batalha da Segunda Guerra Mundial, que alguns historiadores garantem ser verdadeiro. O relato que se segue é uma prova de que o jazz só faz amigos. Americanos e alemães fizeram uma trégua entre o Natal de 1944 e o Ano Novo de 1945. No primeiro dia, alguns soldados americanos aproveitaram o cessar-fogo temporário para ouvirem discos de jazz numa vitrola portátil movida por uma manivela que acionava o motor.

No dia seguinte, um soldado alemão caminhou rumo à trincheira americana empunhando uma enorme bandeira branca. Recebido inicialmente com muita desconfiança e falando inglês razoavelmente, o alemão disse que no silêncio da noite anterior ouvira o som da alguns discos de jazz que vinha da trincheira americana. Identificando-se como pianista de jazz, pediu licença para juntar-se a eles a fim de compartilhar a audição da música que ele mais amava, no que foi prontamente atendido.

Depois das primeiras palavras, os americanos revistaram-no, certificando-se de que o propósito do alemão era realmente juntar-se a eles para ouvir jazz. Após a autorização do seu comandante para o alemão integrar-se a eles, o gelo inicial dos americanos deu lugar à cordialidade, passando o resto do dia ouvindo os V-Discs que o governo americano prensara especialmente para os soldados no campo de batalha. Fascinado, o alemão ouviu gravações que nem supunha existirem, inclusive fazendo comentários pertinentes sobre o que ouvia. No fim da tarde, ele voltou para sua trincheira, não sem antes pedir licença para retornar no dia seguinte, sendo prontamente atendido.

Nos dias subseqüentes, como velhos conhecidos, os americanos e o alemão continuaram a audição de discos e a camaradagem entre eles aumentava à medida em que a música rolava. Aqueles dias de trégua foram abençoados, fazendo-os esquecer momentaneamente os horrores da guerra ouvindo Duke Ellington, Count Basie, Eddie Condon, Frank Sinatra, Bing Crosby, Les Brown, Teddy Wilson, Benny Goodman, Tommy Dorsey, Ella Mae Morse, Benny Carter, Joe Bushkin, Bunny Berigan, Harry James, Teddy Powell, Woody Herman, Ella Fitzgerald, Coleman Hawkins, Lester Young, Jimmy Dorsey, Perry Como, Nat King Cole e tantos outros artistas americanos. As conversas eram animadas, comentavam as músicas em seus mínimos detalhes, trocavam idéias e opiniões, brotando uma sincera amizade entre eles, protagonistas de uma guerra estúpida que o destino colocou-os como inimigos.

Essa confraternização prolongou-se por toda a trégua, terminando ao entardecer do dia de Ano Novo de 1945, porque as hostilidades recomeçariam na manhã seguinte.

Segundo os relatos, a despedida foi comovente. Todos se abraçaram formando um círculo. Chorando emocionados, despediram-se como velhos amigos, prometendo que depois da guerra se encontrariam para festejarem a paz e ouvirem muitos discos de jazz.

O relato não informou se o encontro pós-guerra foi realizado, porém deixou a certeza, mais uma vez, se ainda fosse necessário, que o jazz realmente só faz amigos.
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Keep swinging,
Raffaelli

Celijon Ramos disse...

Eu já havia lindo essa belíssima crônica do admirável Raffaelli. Grande é o prazer de relê-la e, agora, em associação a esta excelente crônica de Érico, cuja a ambientação tem o mesmo lugar: o jazz em tempos de guerra. Sobra sempre algum um generoso espírito humano.

Érico Cordeiro disse...

Queridos Celijon e Raffaelli,
Uma história maravilhosa. O jazz é mágico, seu poder transcende o entendimento meramente cartesiano das coisas - é sobrenatural em sua capacidade de emocionar e comover.
Precisamos de mais jazz em nossas vidas, em nosso mundo tão conturbado e pouco fraterno - a força da canção sobrepuja a do canhão - é disso que precisamos!!!
Um grande abraço aos dois preciosos amigos!

Sofia Urko disse...

Caríssimo Érico, que belíssima história e que sons tão interessantes..A arte, mais uma vez, a transpor barreiras impensáveis e a humanizar os mais gélidos corações. Peço desde já desculpa por este post, à postreriori(!), mas tem sido uma altura de grande trabalho(fim de ano escolar com mil reuniões) para mim e por isso as minhas visitas andam algo atrasadas mas vou recuperar!!Um abraço com amizade, Sofia :)

James Magno Farias disse...

Excelente irmão; viu o que eu te falei sobre o risco que corremos em te perder para as letras?
Quanta fluência!
Eu consegui sentir na pele o medo dos músicos; me lembrou o post sobre a perseguição aos intelectuais na WWII. Tempos difíceis; ainda bem que havia déspotas esclarecidos como o oficial alemão.
abração,
JM

Érico Cordeiro disse...

Cara Sofia e irmãozinho James,
Fico feliz em vê-los e concordo com vocês - a arte redime e enobrece o ser humano.
Um carinhoso abraço aos dois!!!

Anônimo disse...

Setzen, sechs!

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