Amigos do jazz + bossa

segunda-feira, 1 de junho de 2009

STEVE LACY, O GÊNIO QUE REINVENTOU O SAX SOPRANO


Em uma fria e deserta praia ao norte da Califórnia, um casal apaixonado troca carinhos e juras de amor eterno. O frêmito que percorre seus corpos denuncia a paixão que os une. Ao seu lado, um cabeludo magricela sopra um nauseabundo sax soprano, cometendo uma série interminável de xaroposos acordes, capazes de fulminar, em apenas poucos segundos, qualquer diabético que passasse por ali. O clima é de total enlevo – parece que ninguém seria capaz de perturbar aquela bucólica atmosfera.


Não obstante, a idílica sessão é interrompida subitamente, quando uma pequena lancha atraca na praia. Desembarcam cerca de dez homens, fortemente armados, e se dirigem, com semblantes nada amistosos, até o local onde estavam os nossos três amigos. Os homens do barco eram piratas somalis que, fugindo de uma patrulha americana, perderam o caminho de casa e ficaram algumas semanas à deriva, até encontrar aquela acolhedora faixa de areia. Sem que dissessem uma única palavra, engatilham suas mortíferas Kalashnikovs e disparam, impiedosamente, contra o indefeso trio, que perece ali mesmo. A débil tentativa de acalmar aqueles espíritos indômitos com uma açucarada versão de “Feelings” fora em vão!


Os homens não perdem tempo. Enquanto alguns despem os cadáveres, outros preparam uma enorme fogueira. Após semanas no mar, comendo apenas minúsculas porções de carne de camelo seca e restos de pão, eles agora poderiam saborear um nababesco banquete, digno dos seus valorosos ancestrais. No dia seguinte, todas as revistas de celebridade do universo estampariam, em suas capas, a estarrecedora manchete: “Kenny G, Julia Roberts e Campbell Scott devorados por canibais somalis”.


Um final que, se não propriamente feliz, certamente seria o mais adequado ao sujeito que atirou na lama o sax soprano e que quase fez com que esse elegante instrumento fosse relegado ao ostracismo por todos aqueles que apreciam a boa música. Mas o instrumento que fez a glória do grande Sidney Bechet agora estava vingado: nunca mais haveria de ser tão vilipendiado pelo lamuriento sopro de Mr. G.


Além de Bechet, outros fabulosos músicos se dedicaram ao sax soprano, como John Coltrane, Courtney Pinne, Benny Carter e o universalíssimo brasileiro Vítor Assis Brasil. Esse instrumento, contudo, nunca granjeou a popularidade que seus primos, o sax alto, o sax tenor e o sax barítono, mereceram dentro da comunidade jazzística. Todavia, há um músico que, dedicando-se apenas ao sax soprano, construiu uma respeitadíssima carreira no jazz e legou aos aficionados uma obra extremamente pessoal, calcada na sonoridade etérea desse singular instrumento: Steve Lacy.


O nova-iorquino Steven Norman Lackritz nasceu em 23 de julho de 1934, no bairro do Brooklyn. De origem judia, Steve se apaixonou pela música de Duke Ellington ainda na infância e aos 13 anos já extraía da clarineta os seus primeiros acordes. Aos 16, trocou a clarineta pelo sax soprano, graças à influência de Sidney Bechet, e dedicou-se ao jazz tradicional. Nos anos 50 conheceu o pianista Cecil Taylor, ligado à música de vanguarda, que o contratou para sua banda. Nesse período, abandonou o dixieland e descobriu a obra de Thelonius Sphere Monk, o compositor a quem passaria a dedicar boa parte de sua energia e talento. Ouvindo milhares de vezes as gravações do Mad Monk, Lacy produziu uma incontável série de discos dedicados a seu ídolo maior, fazendo releituras extremamente originais da produção monkiana e inscrevendo seu nome entre os maiores inovadores do jazz.


A primeira incursão de Lacy pela obra de Monk está registrada no álbum Reflections, gravado para a Prestige em uma única sessão, no dia 17 de outubro de 1958. Trata-se de um álbum extraordinário em todos os sentidos, um dos melhores do saxofonista, que ainda haveria de legar à posteridade uma discografia extensa e altamente recomendável. A começar pela escolha do impecável repertório, integrado por sete magistrais composições de Monk. Embora nenhuma delas seja das mais conhecidas (pelo menos não tão conhecidas como “Round Midnight”, “Epistrophy”, “Straight, No Chaser” ou Bemsha Swing, por exemplo), todas são de altíssimo nível, revelando toda a complexidade harmônica e melódica que o monge era capaz de conceber.

Outro ponto alto do disco são os músicos escolhidos por Lacy para acompanhá-lo. No piano, o sinuoso Mal Waldron, espécie de irmão gêmeo musical de Monk, com seus acordes espaçados e sua percussividade singular, quase metálica. Na bateria, o fenomenal Elvin Jones, que demonstra porque é um dos mais versáteis músicos do jazz, capaz de desfilar à vontade tanto em um violento hard bop quanto em uma lírica atmosfera cool. No baixo, o velho amigo Buell Neidlinger, um músico erudito quase desconhecido, que batia ponto na prestigiosa Houston Simphony Orchestra
mas que também era apaixonado por jazz, tendo gravado com certa regularidade com Cecil Taylor e Anthony Braxton.


Parece haver uma eletricidade sobrenatural percorrendo as gravações e impregnando aqueles quatro músicos. “Four In One”, que abre o disco, é um bebop tipicamente monkiano, com um andamento quebradiço, nada previsível. Jones pode ser apontado o maior destaque da faixa, com o seu tradicionalmente belo trabalho de pratos – mas dos outros deve-se dizer que estão nada menos que soberbos. A segunda música é uma balada intimista, mas com um discreto swing, que dá nome ao álbum e permite a Lacy uma exibição de técnica apurada e lirismo, enquanto o piano de Waldron parece brincar por sobre os acordes da canção.


“Skippy”, “Hornin’ In” e “Bye-ya”, com suas estruturas complexas e suas repentinas alterações rítmicas, são os veículos mais que perfeitos para o quarteto demonstrar toda a sua capacidade de improvisação e a sua completa sintonia. Elvin e Waldron estão perfeitos e o discreto Neidlinger mantém o esqueleto harmônico das composições com rara maestria. O seu baixo não se impõe pela velocidade ou pelo virtuosismo, mas pela precisão com que se coloca em face dos demais instrumentos – parece não estar ali, mas o ouvinte sente a sua pulsação. Em “Let’s Call This”, Lacy usa uma afinação mais aguda e incisiva, como se quisesse realçar as obliqüidades da canção. Em mais uma balada, a emocionante “Ask Me Now”, saxofone e piano interagem de forma quase telepática, com um instrumento fazendo o contraponto lírico à passagem do outro, e, outra vez, percebe-se o magistral trabalho de Neidlinger, a sustentar a base rítmica da música com discrição e sobriedade.


Espírito inquieto, Lacy sempre esteve aberto a novas experiências musicais, gravando nos mais diversos contextos: álbuns solo, duos, tributos a Monk, pequenos combos e big bands. Muito ligado a todas as formas de manifestação artística, sua influência ultrapassa as fronteiras do jazz e se espraia pelas artes plásticas, cinema e literatura. No final dos anos 60, com a pequena visibilidade do jazz nos Estados Unidos, mudou-se para a França, onde foi acolhido com entusiasmo pelos numerosos jazzófilos daquele país. Gravou com grandes nomes do jazz europeu, como o italiano Enrico Rava, o francês Jean-Jacques Avenel e o inglês Evan Parker. Morreu em 04 de junho de 2004, em decorrência de um câncer no fígado, que jamais deixou que o abatesse. Seu compromisso com a vida e com a arte que professava era tão grande que mesmo muito doente, ainda se apresentava ao vivo até poucos dias antes de falecer.



***************

PS.: Post dedicado ao capitão John Lester, cruzado moderno e incansável paladino que, a bordo da nave Jazzseen, enfrenta com muita galhardia o dragão da vulgaridade e da descartabilidade musical.

47 comentários:

APÓSTOLO disse...

Prezado ÉRICO:

Excelente texto e soberba escolha musical. LACY foi um dos "mestres" em dominar o fugidio soprano.
A companhia de MAL WALDRON enriquece qualquer gravação e nesse caso, com certeza, é ponto alto.
Parabéns ! ! !

Salsa disse...

Existe uma teoria conspiracionista que afirma ser o Kenny G apenas mais uma experiência para lobotomizar a humanidade para que alguém possa dominar o mundo. Dizem que já está no forno o Kenny H, uma versão mais fatal do projeto.
Tenho o disco citado e outro - Let's call this steem, de 93 - com a mesma dupla. Estava engatilhado para um post. O som é bastante ousado.

Érico Cordeiro disse...

Caros Salsa e Apóstolo,
É sempre bom poder contar com as suas excelsas presenças! Pois é, e o que me deixa mais p* é chegar nas lojas de disco (que aqui em São Luís nem existem mais) e encontrar o dito cujo regiamente assentado nas preteleiras de... JAZZ!
É um absurdo. Tenho também o Evidence, que é muito bom, mas com uma tonalidade um pouco free (no trompete, Don Cherry).
Legal que vocês gostaram do post e do músico. Espero que Mr. Lester, a quem dediquei o post, também goste.
E, pelo amor de Deus, precisamos descobrir em qual laboratório está sendo criado o tal Kenny H. (esse moço vai tocar o quê, gaita de fole?).
Abração a ambbos!

Salsa disse...

PS - o disco postado é o que eu mais gosto. Eu acho que Lacy, às vezes, viaja demais.

edú disse...

Steve Lacy retornou a morar nos EUA meses antes de sua morte para dar aulas no New England Conservatory em Boston.

Érico Cordeiro disse...

Caro Edú,

Um músico de muita personalidade e que tem uma obra extensa e multifacetada. É uma descoberta relativamente recente prá mim (até pouco tempo eu apenas o conhecia de nome e achava que era um músico muito "difícil", o que não é verdade), mas já estou com gosto de quero mais.
E o bacana é que ele imprime uma sonoridade própria ao sax soprano, ora soando como uma clarineta, ora como um sax alto - a isso é que se dá o nome de talento, não é?
Grande abraço!!!

John Lester disse...

Mr. Cordeiro, ouvindo a faixa e lendo o texto, passei pela mesma aflição que assolou o famoso asno de Buridan, pobre asinino que, colocado diante de dois maços idênticos de feno, morreu de fome por incapaz de decidir qual deles comer.

Felizmente, ao contrário do pobre animal, saio daqui empanturrado com saborosos texto, música e dedicatória.

Grande abraço, JL.

Érico Cordeiro disse...

Mr. Lester,

É sempre muito prazeroso abrir a caixa de comentários e deparar-me com suas palavras sempre muito gentis. A homenagem é singela mas muito sincera. Você merece todas as loas, afinal não é fácil capitanear um espaço tão bacana, sempre recheado de ótimos textos e dicas, com muito humor e muito zelo pelo jazz e pelos ouvidos e corações de seus inúmeros leitores.
Grande abraço!

Carlos disse...

Érico,
aqui está a visita prometida. Gostei muitíssimo do teu blogue; as escolhas musicais são de primeira água. Fiquei, inclusive, a conhecer discos que desconhecia. Continuarei a frequentar este espaço.
Um abraço.

Érico Cordeiro disse...

Prezado Carlos Azevedo,
Seja muito bem vindo a esta casa, que é sua também. Que bom que você gostou do que viu/ouviu e será sempre um prazer tê-lo aqui no JAZZ + BOSSA. Volte sempre, portanto.
Um fraternal abraço do lado de cá do Atlântico!

figbatera disse...

Muito boa a estória que encabeça a resenha...rs

Como sempre, um show de texto e conteúdo, com merecida dedicatória ao meste Lester.

DAniel Nakamura disse...

Muito bom o Blog, Érico !!! Mais um para a lista dos favoritos !
Abraço !

James Magno Farias disse...

Muito divertido esse texto.
Com certeza Kenny G faz parte de alguma conspiração da CIA para nos enlouquecer rss.
Inclui emeu blog em teus favoritos,http://colunas.imirante.com/jamesmagno/

Érico Cordeiro disse...

Caros Figbatera, Daniel e James,
Obrigado por suas visitas (no caso do Daniel, receba também um "seja bem-vindo" especial). Obrigado pelas palavras carinhosas - essa resenha foi muito gostosa de fazer e imaginava que os amigos do JAZZ + BOSSA fossem gostar.
E pensar que os dois tocam exatamente o mesmo instrumento. Mas isso é comum, afinal Bud Powell e Richard Cleiderman (ora, mas que boa idéia para um banquete II, a missão!) também tocam o mesmíssimo instrumento.
Grande abraço aos três!!!
PS.: Molosso, já vou providenciar o link!

José Domingos Raffaelli disse...

Érico,

Caramba, esqueci de mencionar um fato importantíssimo: Steve Lacy passou pelo Rio em 1966, a caminho de Buenos Aires, trazendo a tiracolo a então jovem promessa do trompete Enrico Rava, além de baixista e baterista africanos. Ficaram dois dias, mas deu para bater um bom papo. Em Buenos Aires, o quarteto gravou o LP "The Forest and the Zoo", hoje peça de colecionadores (penso que o título seja esse, mas como nunca tive o LP, pode ser que esteja enganado).
Keep swinging,
Raffaelli

José Domingos Raffaelli disse...

Pessoal,

Tudo indica que meu post anterior ai que enviei mencionando a vinda de Lacy com Rava ao Rio, perdeu-se no cyber space. Infelizmente, refazê-lo agora seria muito difícil, mas tentarei mais tarde.
Desculpem o mau jeito,
Raffaelli

Vagner Pitta disse...

Aqui estou eu, como prometido!

Bem, Lacy sempre foi um viajante dos mais aventurosos mesmo! Há discos que foram feitos apenas para pessoas de ouvidos abertos à sonoridades estranhas, ríspidas e assimétricas...mas a criatividade sempre foi o seu termo! É um músico até bem falado no Brasil, mas é dos mais falados e dos poucos compreendidos! Essa fase monkiana de Lacy é a mais louvada, mas a fase européia tbm deve ser ressaltada: trata de uma fase experimentalista com a qual Lacy nunca lançou um disco igual ao outro subsequente, fugindo daquele manjado free jazz masturbatório e sem criatividade!

Abraços caro Érico! Seu blog está de parabéns!

Érico Cordeiro disse...

Sinto-me duplamente honrado em receber as ilustres visitas do Mestre Raffaelli (que já pode se considerar patrimônio da casa) e do Vagner Pitta, outro paladino da qualidade musical e da descoberta de novas posssibilidades sonoras.
Sejam muito bem vindos.
O Lacy não era apenas um talentoso descobridor de sons mas também de jovens talentos - Rava que veio a se tornar, talvez, o maior nome do trompete europeu.
Gostei do "manjado free jazz masturbatório" - acho que esse hermetismo faz mal ao estilo e creio que não era essa a proposta de Ornette Coleman quando começou a busca pela sonoridade "livre".
Obrigado pela presença e pelas palavras gentis e, por favor, voltem sempre.
Grande abraço a ambbos!

Salsa disse...

Não creio que Lacy direcione seu trabalho para um público específico "de ouvidos abertos à sonoridade estranhas". Ele faz música e se permite viajar. É criativo, inventivo, e ponto. A nós, reles mortais, resta sermos atropelados por sua volúpia. Em alguns momentos, admito, saí com algumas contusões.

Sergio disse...

"STEVE LACY (5 X MONK 5 X LACY) Ñ GOSTEI

STEVE LACY (EARLY YEARS - DISC 1 & 2) !!!!!!!!!!!!!

STEVE LACY (THE STRAIGHT HORN OF STVE LACY) 1961 + OU -"

Foi assim q registrei, no meu arquivo de álbuns mp3, minhas 3 experiências com Lacy. Exemplifico porque foram contatos bastante recentes. Mas senti q o cara tinha mais pra mostrar. Tanto q comentei no jazzseen e pedi sugestões a mr. Lester para outros discos menos complexos. Agora, com Reflections terei outra oportunidade.

Quanto ao churrasco com 'G', soprando ou ele bem passado ao vinagrete, eu não estaria lá.

Sergio disse...

Aproveitando o ensejo: dr. Érico, será q vc poderia me ajudar com essa dúvida cruel?

http://www.4shared.com/file/109399740/c1a97d54/Viktoria_Tolstoi__My_Russian_Soul__02_Word_by_word.html

No link acima tem uma música somente. E eu tenho certeza q nela tem fragmentos de algum clássico - clássico do erudito mesmo -, de algum compositor russo, talvez, q o autor sampleou e encaixou na canção. Achei belíssimo o tema, 'teiquerize-se' dr. pq não será sacrifício nenhum ouví-la. E é como disse lá na postagem da cantora Viktoria Tolstoy, diante da dúvida que não me dá sossego: me ajuda, buda!

José Domingos Raffaelli disse...

Tentarei refazer o post ao qual me referi oomo "deve ter-se perdido no cyber space", naturalmente devido a alguma barberagem minha.

Referindo-me a Steve Lacy, afirmei que ele e Mal Waldron fizeram um duo sensacional no I Chivas Jazz Festival, em 2001, em São Paulo.

Ao que saiba, o único músico brasileiro que toca exclusivamentre soprano é Zé Nogueira. Por isso, sempre chamei-o de "Steve Lacy brasileiro".

Coltrane influenciou muitos saxofonistas e tocarem o soprano. Todavia, na mesma época, outro sxofonista começou a dobrar no soprano: o injustiçado e underrated Lucky Thompson, que surgiu nos anos 40 gravando uma série de discos muito interessantes, inclusive com Count Basie. Nos anos 50 ele gravou com Milt Jackson e Oscar Pettiford alguns LPs muito bons e, posteriormente, quando foi para a França, gravou abundantemente com músicos locais. Foi em Paris que adotou o soprano e, suponho, deva ter influenciado o jovem Barney Wilen a tocá-lo, que gravou gravado alguns discos nesse instrumento em 1959/1960.
Depois de viver em Paris, retornou a New York, porém não demorou em fixar-se na Suiça. Nessa época entrei em contato com ele e mantivemos um bom fluxo de correspondência.
Por volta de 1968 ou 1969 (não posso precisar a data), ele foi contratado para tocar em Buenos Aires e queria aproveitar a chance para tocar no Rio, pedindo minha ajuda para indicar uma boa seção rítmica brasileira. Apesar de não ser empresário, fiz o que podia, sem sucesso. O diretor da Sala Cecilia Meireles disse francamente que só programavam música clássica (anos depois também passaram a apresentar conjuntos de jazz). Os músicos brasileiros que entrei em contato para acompanhá-lo, caso fosse confirmado, pediram U$ 2.000 cada um, o que seria completamente inviável para ele bancar do seu bolso. Assim, infelizmente nada feito.
Lucky passou a viver entre a Suiça e New York, gravando alguns discos para o selo Rivoli ("Lucky's back" é notável) e para a Prestige, dos quais "Lucky Stricks" (trocadilho com a famosa marca de cigarros) é uma obra-prima.
Aos poucos, Lucky foi-se desiludindo do meio musical com o rock e depois s malfadada (con)fusão, sentindo-se um peixe fora d'água e, tocando cada vez menos, aos poucos saiu de cena.
Ele desapareceu, ninguém soube do seu paradeiro, até descobrirem
que ele vivia como morador de rua em Seattle, Washington, revirando latas de lixo para comer e recusando receber assistência médico-financeira. Inclusive, Stanley Turrentine ofereceu-lhe um sax-tenor, mas ele recusou. Finalmente, após longos dias e noites passados nas ruas, foi internado num asilo, onde veio a falecer totalmente esquecido e sepultado pela poeira do tempo.
A meu ver, Lucky Thompson foi um dos mais injusticados e underrateds do tenor, ao lado de Wardell Gray. Dono de sonoridade e estilo facilmente identificáveis, foi a grande influência de Benny Golson no início da sua carreira.
Sua obra primou pelo bom gosto, sem jamais utilizar o exibicionismo vulgar, sempre mantendo a excelência que caracteriou sua obra como o altíssimo padrão da qualidade da sua música.
Não acreditam ? Ouçam "I Forgot to Remember" do CD "Lucky Strikes". Duvido que ninguém se renda ao seu intenso feeling transbordante de emoção. Quando ouço essa pérola, sempre tenho dificuldade de reter as lágrimas. Digo isso sem qualquer dose de pieguice.
Lucky Thompson foi um homem cuja alma de artista está presente em tudo que tocou.
Keep swinging,
Raffaelli

Celijon Ramos disse...

Érico, tudo bem.
Esse comentário foi só pra lhe mandar um abraço. Estou contemplado e enriquecido pelas informações do texto, dó áudio e pelos cometários dos demais visitantes.

Érico Cordeiro disse...

Prezados Salsa, Sérgio, Raffaelli e Celi,
É sempre um ótimo augúrio para mim e para essa casa contar com as presenças de vocês - e com direito a uma aula magna do Professor Raffaelli, cujos comentários são, tenho certeza, um dos maiores atrativos para quem se aventura a navegar pelo JAZZ + BOSSA.
Creio que não possuo nada do Lucky Thompson (seguramente nada como líder, talvez algo como sideman, mas tenho que procurar), mas vou pesquisar - e, espero, adquirir - algo sobre ele (pelo relato do Mestre Raffaelli, é uma história de vida e tanto e que simboliza o que passaram tantos outros jazzistas talentosos).
Mr. Salsa, concordo com você, no sentido em que o Lacy, assim como todo artista que constrói uma obra muito pessoal, compõe, toca (ou escreve, ou atua) como uma maneira de exprimir a si próprio e falar de suas emoções. Se essa forma de expressão encontra eco no outro, dá-se a magia da arte: a mensagem foi captada e transformou o discurso em emoção para o receptor (seja essa emoção o amor, o ódio, a raiva, o encantamento, etc.). Mas creio também que determinadas fases do Lacy, em especial a ligada ao free (que só conheço de leituras, já que nunca ouvi) somente podem ser entendidas em sua íntegra por "pessoas de ouvidos abertos à sonoridades estranhas, ríspidas e assimétricas". Confesso que além dos primeiros discos do Ornette Coleman não curto free - e creio que você também não, daí as contusões - mas também não creio que me enquadro na descrição do Vagner (embora seja um conservador, estou curioso para conhecer essas aventuras do Lacy pelo universo free - talvez seja ).
Seu "Dr. Sérgio", a música é muito bacana - tem um quê de bossa nova e a voz da cantora é bem aconchegante (o solo de piano é lindíssimo - o(a) pianista sabe das coisas). Não conheço quase nada de música erudita, mas penso ter ouvido um pequeno trecho do Rhapsody In Blue, de Gershwin (mas não apostaria um centavo nosso, viu Seu "Dr. Sérgio").
Celi, valeu a lembrança e vamos combinar algo pro fim de semana, ok?
Um fraterno abraço a todos!

Sergio disse...

Grande Érico. Eu tive uns problemas recentes no meu computador e fui obrigado a fazer um becup apressado dos meus últimos álbuns mp3, sem ver/me lembrar q já tinha este Reflection. Vês como intuí q o som de Lacy tinha poder? Corri atrás da obra, amigo... Ontem ouvi Reflection e é mesmo muito bom, principalmente, ouvindo e lendo seu texto. O disco é mais manso. No sentido de q não é preciso ter um intelecto privilegiado para se saber separar o som da fúria. Caso daquele "5 X MONK 5 X LACY", citado acima, dificílimo, meu caro. Ligação direta com o seu xará Dolphy. Eric Dolphy e o divisor de águas “Out To Lunch”. De tão incensado, só deus sabe o quanto tentei entender essa obra... Mas... sem chance. Ficou puxado pra mim. Imagine essa imagem: um asno de head-phone. Desisti antes que me visse assim no espelho. Obras de arte também fazem esse efeito devastador pra nossa auto-estima, meu bom.

Poxa, será que a solução do mistério da canção q te mandei está na Rhapsody In Blue? Que trabalho “ruim” será ouvi-la mais uma vez para descobrir se sua dica está correta...
Valeu!

Em tempo: o pianista que acompanha Viktoria Tolstoi é Jacob Karlzon. E é tudo isso q vc percebeu.

Salsa disse...

Sobre Thompsom.
Não sabia dessa passagem do grande saxofonista - história bastante forte. Curioso senso de dignidade e de amargor povoa o relato de Rafaelli. Ele é realmente underrated - meus amigos ficavam reticentes quando eu louvava seu trabalho. Creio que no Lucky strikes, disco que foi abduzido da minha discoteca, tem uma versão agradabilíssima de In a sentimental mood. Tentarei recuperá-lo.

Érico Cordeiro disse...

Caros Salsa e Sérgio,
Procurei alguma coisa sobre o Lucky Thompson e achei algumas gravações dele em Paris, a preços módicos, além do Lucky Strikes e fiz uma pequena loucura - adquiri-os!!!!
Não vejo a hora de recebê-los e desfrutar desse músico sobre quem os Mestres Raffaelli e Salsa falaram tão bem.
Caro Sérgio, a imagem do asinino de headphone tentando descobrir os mistérios do Out To Lunch cabe à perfeição para descrever esta singularíssima pessoa que redige esta missiva virtual - também não entendi patavinas!!! Prefiro o Out There - é muito mais interessante pro meu paladar auditivo (isso existe??!!??!!).
Grande abraço a ambos!!

José Domingos Raffaelli disse...

Prezado Salsa,

Você está certíssimo. "In a Sentimental Mood" é uma das faixas do excepcional "Lucky Strikes". Este CD foi um dos pontos altos da carreira de Lucky. TODOS seus solos são impregnados de uma beleza melódica devastadora, deixando-me emocionado pela alta carga de feeling que projeta em cada frase, cada nota, cada inflexão no tenor e soprano.
Tenho um amigo que fez severas restrições a Lucky, mas, após algum tempo, rendeu-se às evidências auditivas da alta capacidade inventiva e emocional do saxofonista.

Érico,

Talvez você (assim como os demais confrades deste blog) tenha o CD de Miles com aquela sessão imortal de 1954 que gerou a fabulosa versão de "Walkin'". Além de Miles e Lucky, reluzem astros do quilate de J. J. Johnson, Horace Silver, talvez Percy Heath (não estou certo) e Kenny Clarke, o verdadeiro pai da bateria moderna.

Keep swinging,
Raffaelli

Érico Cordeiro disse...

Caro Mestre Raffaelli,
Sua memória não o trai. A formação que gravou o Walkin' é exatamente essa, com a adição de Davey Schildkraut (que nome!!!!) no sax alto em algumas faixas. Pena que o Lucky Thompson só toque em duas (Walkin' e Blue n' Boogie). Estou ansioso pela chegada do Lucky Strikes, pedido ontem mesmo.
Abraços!

Vagner Pitta disse...

Muito interessante a menção ao saxofonista Lucky Thompson aqui no post do Lacy. E é mais que natural essa menção, pois o Lucky, como bem discorreu Rafaelli, também foi um dos primeiros a usar o sax soprano.

A mais ou menos dois anos atrás eu escrevi uma resenha sobre o Lucky, deixando disponível pra download o disco "Acent on Tenor". Mais recentemente eu deixei um registro com Dinah Washington de 1945 onde, se eu não me engano, o Lucky é o solista leader a frente de uma orquestra que tinha feras do quilate de Charles Mingus e Milt Jackson. Abaixo o link pra quem se interessar

http://farofamoderna.blogspot.com/search/label/Lucky%20Thompson


Abraços!!!...estou contente com tantas pessoas reunidas aqui falando de jazz...rs!!!

Sergio disse...

Caro Érico, sinto informar-lhe que ficará mais pobre. A notícia boa é que serás um pobre mais feliz! É excelente o Lucky Strykes. Então porque mais pobre? Porque vais querer obter mais do mesmo, ora! Aí lhe direi o que já ouvi e indico sem apontar favoritos: “Tricotism”, “Soul's Nite Out” com Tete Montoliu, “Happy Days”, “Jazz In Paris”, e... E ainda estou trabalhando na busca da obra do homi. Há muito mais para saborear. Sabe o que ainda se encontra na Rede? Um álbum tributo de um certo Michael Blake - “garoto novo no jazz” 40 e poucos anos ainda -, com a pérola “A Tribute to Eli 'Lucky' Thompson” que é simplesmente um primor! Estou agora mesmo ao sabor desse disco.

Enfim, a troco de felicidade. Essa não é a única barganha inteligente a que se destina um punhado de dinheiros? É por isso que optei em trabalhar e ganhar pouco, Érico. Só me falta uma mulher mais que compreensível, mas com o mesmo prazer, pq com a riqueza sonora que acumulo todos os dias aqui, sem pagar um centavo, uma doce mulherzinha de aparência agradável e que goste do que eu gosto, o que mais me faltará na vida? Moro na Zona Sul do Rio de Janeiro, senhor Érico. Se tropeço num hidrante, dou de cara com a Lagoa Rodrigo de Freitas e se o tropeço for na direção contrária, ainda tenho que decidir na queda, se me esborracho em na praia de Ipanema ou do Leblon! De modus q... É ou não é uma maravilha?

Agora, olha aí, estás vendo? Mais um álbum acima. Quem disse que o paraiso fica no céu?

Abraços! Depois me diga, por favor, sem a necessidade de ser gentil, o que achou da minha eleita "rainha da suécia".

Érico Cordeiro disse...

Mr. Sônico, deixei um comentário sobre a rainha da suécia no mui digno blog conduzido por V. Senhoria!
Quando baixar os outros discos lhe falo, mas a primeira impressão (que é a que fica), foi a melhor possível. Faço votos de que esse casamento dê certo (creio que a Viktoria deva se enquadrar direitinho no perfil que você procura), embora as tentações do eixo Ipanema Leblon sejam enormes. Vou dar uma procurada no álbum do Michael Blake.
Mr. Pitta, é muito bom tê-lo a bordo, enriquecendo este saudável debate sobre essa música extraordinária que é o jazz. Vou dar uma procurada no link que você me passou e também no álbum indicado (Acent on Tenor). Acho que do Lucky Thompson só tenho o Walkin', do Miles Davis - talvez tenha mais coisa com Charlie Parker e Dizzy Gillespie, da década de 40, mas alguns discos nem têm ficha técnica e a qualidade sonora (da gravação e não dos músicos, que fique bem claro) não é muito boa.
Grande abraço a ambos e obrigado pela presença e pelos comentários reveladores (reveladores até demais - Seu Sérgio, tenha pena dos meus pobres bolsos!!!).

Jarbas Couto e Lima disse...

Caro amigo Érico,
Sinceramente, passei só pra deixar um abraço. Não tenho cultura jazzística para comentar artigos tão belos e complexos. Desta forma, folgo em lê-lo. Além disso, curto muito mesmo é o som do seu blog. O melhor ambiente jazzístico da ilha.
Um beijo!
Jarbas

Sergio disse...

Por mim dessa despesa já está livre.

http://www.4shared.com/file/109918520/bd20017e/Michael_Blake__A_tribute_to_Eli_Lucky_Thompson__Part1.html

http://www.4shared.com/file/109922215/cb352a03/Michael_Blake__A_tribute_to_Eli_Lucky_Thompson__Part2.html

Érico Cordeiro disse...

Grande Sérgio, valeu a dica! Vou dar uma conferida no cara - se você recomenda, é porque vale a pena. Um sonoro abraço!
Jarbinha, você e sua modéstia do tamanho do seu coração generoso. Por favor, aqui é uma casa de amigos (ainda vou inventar um chopp virtual - a cada comentário o visitante recebe uma tulipa geladíssima e com um colarinho na medida) e não se acanhe em expor sua valiosíssima opinião - afinal se tem alguém aqui que entende de música é você (o homem dos dez instrumentos)!!!!!
Grande beijo, cara, você sabe que tem um camarote vip nesse meu coração vagabundo!

APÓSTOLO disse...

Prezado ÉRICO:
A série "JAZZ IN PARIS" do selo "GITANES" possui algumas preciosidades com LUCKY THOMPSON, entre elas e a meu juizo a melhor, o album "LUCKY THOMPSON - MODERN JAZZ GROUP", em que o desfile de pérolas é gratificante ("The Man I Love", "Tight Squeeze" do próprio LUCKY e mais uma série de belas composições do pianista HENRI RENAUD que acompanha LUCKY). Quarteto em 04 faixas e grande formação em mais 05 faixas.

Érico Cordeiro disse...

Grande Apóstolo,
Esse Jazz in Paris recebeu três ou quatro estrelas no Penguin e é um dos discos que pedi. Não encontrei o LUCKY THOMPSON - MODERN JAZZ GROUP, mas já tá na minha lista dos desejos futuros (e põe futuro nisso!!!).
Grande abraço!!!!

APÓSTOLO disse...

Prezado ÉRICO:

Lembro que podemos apreciar LUCKY THOMPSON solando alguns poucos compassos no documentário "Celebrating Bird - The Triumph of Charlie Parker" de Gary Giddins, lançado em conjunto com o livro (mesmo título, mesmo autor) em 1987.

Érico Cordeiro disse...

Valeu a dica, Grande Apóstolo.
Não conheço o documentário (nem o livro), mas o Gary Giddins é figurinha carimbadíssima da crítica musica e assina uma infinidade de linner notes, de diversos grandes jazzistas. Mais uma prá célebre listinha que não pára de crescer!!!

José Domingos Raffaelli disse...

Um adendo relacionado a Barney Wilen
Quem possui os dois volumes dos CDs "Barney", de Barney Wilen, gravados ao vivo no clube Saint Germain, em abril de 1959, constatará que o saxofonista francês já tocava sax-soprano, portanto antes de Coltrane adotar o instrumento.
O quinteto que Barney lidera inclui Kenny Dorham, Duke Jordan, Gilbert Rovere e Daniel Humair.
Todos em excepcional forma, especialmente Dorham e Duke Jordan. O repertório é formado por temas de jazz e músicas standards. O solo de Duke Jordan em "Lady Bird", do genial e criminosamente esquecido Tadd Dameron, é um dos mais instigantes, inventivos e repletos de idéias variadas concatenadas com excitante continuidade num nível como raros pianistas de jazz alcançaram. É só ouvir com atenção para constatar a categoria de Duke Jordan.
Keep swinging,
Raffaelli

Érico Cordeiro disse...

Caro Mestre Raffaelli,
Vou dar uma procurada nesses discos. Devem ser espetaculares (a banda que acompanha o Wilen é maravilhosa).
O senhor tem razão. O Tadd Dameron foi um dos maiores arranjadores e compositores do jazz (tenho apenas 2 cds dele e mais um em sua homenagem, com Kenny Barron, Slide Hampton, Ron Carter e outras feras), mas infelizmente, anda meio esquecido. Ótima sugestão para um futuro post!
Abraços!

José Domingos Raffaelli disse...

Caro Érico,

Tadd Dameron foi um dos maiores compositores e arranjadores do jazz. Suas composições possuem rara beleza melódica e várias delas integraram o repertório de inúmeros músicos. Como arranjador, influenciou Quincy Jones, Benny Golson, Gigi Gryce, Horace Silver e Oliver Nelson, entre outros, que utilisaram suas técnicas (passagens arranjadas entre os solos que davam maior variedade às interpretações, além de inserir o que ele denominava de "countermelodies" como variações do tema principal. Golson e Gryce absorveram seus ensinamentos quando tocavam e gravaram num conjunto liderado por Dameron que contava, entre outros, com Clifford Brown e Philly Joe Jones
Quando cumpriu pena na Prisão Federal de Lexington, no Kentucky, ele cozinhava para o diretor da peniteciária, que, en troca, deixou-o formar uma big band com jazzmen que cumpriam pena, entre eles Red Rodney, Idriss Sulieman, Oliver Beener, Art Pepper e Frank Morgan.

Quando terminoui sua sentença, Dameron pediu ao diretor que o deixasse continuar morando na prisão porque não tinha para onde ir, nem dinheiro algum e, em troca, ele continuaria cozinhando para ele.
O diretor recusou porque aquilo feria o regulamento da prisão, mas, por sorte, o produtor Orrin Keepnews ofereceu-lhe um contrato para gravar um disco para a Riversade e assim ele voltou à música.
Keep swinging,
Raffaelli

Érico Cordeiro disse...

Mestre Raffaelli, que história - e que banda!!!!!! Dificilmente algum arranjador (digamos "solto") poderia contar com talentos tão extraordinários quanto os que o nosso encarcerado Tadd Dameron contava. Esse é um ótimo tema para uma futura postagem (se você permitir que eu use a história como mote). Estou aguardando ansiosamente o Fontainebleau que encontrei a um preço camarada na internet. Se juntará aos outros (poucos) discos desse grande criador.
Grande abraço!!!!

José Domingos Raffaelli disse...

Ainda sobre Tadd Dameron.

Ele gravou o excelente "Mating Call" para a Prstige, em 1956, no qual atuaram John Coltrane, John Simmons e Philly Joe Jones.

Em 1956, Coltrane ainda buscava seu próprio estilo e suas gravações na época revelavam um solista impetuoso e vibrante.
Nesse disco Dameron ensinou-o a tocar baladas, um terrirório que ele não dominava nem estava habituado a abordar. Quem tiver essa jóia ouvirá Coltrane aprendendo a trilhar o caminho certo nas duas maravilhosas baladas "In a Misty Night" e "Soultrane".

Keep swinging,
Raffaelli

Érico Cordeiro disse...

Caro Mestre Raffaelli,
Esse é um dos discos poucos do Dameron que eu tenho. Muito bom mesmo, e eu adoro "Gnid", outra balada lindíssima, que lembra em algumas passagens a também estupenda "The Talk Of The Town" (é aquele tipo de canção que dá vontade de sair dançando pela casa, embora eu possua dois pés esquerdos, rs, rs, rs...).
Comentário postado ao som de outro grande compositor/arranjador, Oliver Nelson, disco Screamin' The Blues, com os ótimos Eric Dolphy e Richard Wyands.
Grande abraço!!!

José Domingos Raffaelli disse...

Érico,

Remexendo meus alfarrábios, encontrei o artigo no qual mencionam alguns músicos de jazz que cumpriam sentença na Prisão Federal de Lexington, no Kentucky, e tocavam na orquestra que Tadd Dameron (outro detento) lá organizou, conforme relatei.
Reparem quantos cobras estavam por lá:

Trompetes: Dupree Bolton, Red Rodney, Idriss Sulieman, Bud Brisbois, Oliver Beener e Tony Fruscella.

Trombones: Frank Rehak e Benny Powell.

Saxes: Art Pepper, Frank Morgan, Walter Benton e Cecil Payne.

Piano: Arnold Ross.

Baixo: Henry Grimes.

Bateria: Dick Scott.

O trompetista Dupree Bolton foi um caso sui generis. Ele gravou apenas três ou quatro discos em nome de outros músicos. Um deles, intitulado "The Fox", do saxofonista Harold Land, é algo fabuloso que vale a pena investir.
O mais incrível a respeito de Dupree Bolton, que passou mais tempo encarcerado do que livre, é que quando foi descoberto declarou não saber o nome dos seus pais, pois fôra abandonado quando nasceu, nem a data ou a cidade onde nasceu. Posteriormente descobriram que nasceu em 3 de Março de 1929, em Oklahoma City, e faleceu em 5 de Junho de 1993.
Aprendeu trompete quando rapazinho, desenvolvendo uma técnica e uma capacidade inventiva incomuns, mas, como frisei acima, volta-e-meia era apanhado envolvido com drogas e cumpria pena de prisão. Quando morreu, por não ter parentes, nem endereço certo, foi enterrado como indigente.
Uma das histórias mais pungentes do jazz.

Caso nenhum dos amigos não o ouviu, vale a pena investir no CD "The Fox".

Keep swinging,
Raffaelli

Érico Cordeiro disse...

Caro Mestre Raffaelli,
The Fox é um dos meus discos preferidos do Harold Land - ouço-o enquanto posto esse comentário. Grande trompete o do Dupree Bolton - lembra muito o Lee Morgan, é viril e lírico ao mesmo tempo.
No piano o grande Elmo Hope. Um super disco, que está na listinha de que lhe falei (de futuras postagens).
O Idriss Suliemann também é um sujeito meio "underrated" (tenho como sideman em alguns discos, inclusive no célebre "The Hawk Flies High", mas nada como líder). Outro virtuose.
O Tony Fruscela era ligado ao West Coast, mas não sei se tenho algo dele como sideman (como líder certamente não).
E essa orquestra - fabulosa!!!! Cecil Payne, Art Pepper, Frank Morgan!!! Só fera, mas o Pepper merece o adjetivo "gênio"!
Grande abraço, Mestre!!!!

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