Maldigo o sol
O sol desatinado e poroso
Maldigo o sol minucioso da manhã
O sol que ecoa na lápide solitária
Maldigo a lua
A lua portátil e fugidia
Maldigo a lua que irrompe por entre as ramas
Maldigo a meteorologia
Quando chove e quando faz sol
Maldigo o silêncio convergente
Maldigo o efeito táctil do drama
Maldigo a polidez cartesiana do decoro
Maldigo a bifurcação do caminho, o rio que dá vau
Maldigo a geologia intacta da retina
Maldigo, maldigo sempre...
Não me impressionam os cálculos agônicos do servilismo
Não me impressionam os sintomas minerais da fleuma
Me causa espécie a serenidade contida,
Me repugna o ócio cultivado sob os dosséis de seda
Me quero livre!
Me quero fora dos círculos do comedimento e do recato
Me quero livre para cuspir na face da etiqueta
Por isso maldigo, agora, neste exato instante
Maldigo porque nunca pude romper os grilhões
Maldigo porque sempre me perfilei
Maldigo porque sempre honrei as convenções
Maldigo a transigência com aquilo que mais desprezo
O habitat castiço e mecânico em que vivo
Queria a incontinência
Queria a estupefação
Mas tudo o que fiz
Foi louvar os medíocres e os emplumados
Abracei a indignação apenas para desonrá-la
Por isso maldigo, neste instante congelado e vulgar
Submeti-me sempre às filigranas da linguagem
Maldigo-as, pois
Maldigo a todos, pela eternidade e adiante
Agora perdi o medo
Agora sou o eu que sempre sonhei ser
Agora posso escancarar-lhes a mediocridade
A putrefação do caráter
A ridícula troca de favores, o apadrinhamento, a hipocrisia
É noite e as janelas estão fechadas
Tomei o cuidado de verificar
Estou só...
Posso maldizê-los à vontade
Mas o faço em silêncio
Pois as paredes têm ouvidos...
=============================
O saxofonista e flautista Joseph Carl Firrantello, nascido no dia 16 de dezembro de 1937, em Chicago, Illinois, teve uma vida bastante turbulenta. Aos 11 anos começou o aprendizado do clarinete, trocado, ainda na adolescência, pelo sax tenor. Aos 18 anos ingressa na University of Illinois, graduando-se bacharel em música em 1959.
Vivendo em uma cidade musicalmente estimulante, seus primeiros passos, como músico profissional, foram dados em clubes e boates de Chicago e arredores. Como dificilmente um sujeito chamado Joseph Firrantello conseguiria ir muito longe na carreira musical, o saxofonista adotou o pseudônimo de Joe Farrell, bem mais simples que o nome de batismo, e foi à luta!
Em 1960 resolve tentar a sorte em Nova Iorque e seu primeiro emprego foi na Maynard Ferguson Big Band, permanecendo ali até o ano seguinte. Em 1962 junta-se à banda do trombonista Slide Hampton, com quem mantém uma parceria de cerca de três anos. Concomitantemente, adquire bastante destaque ao participar, ao longo daquela década, de álbuns de gente como Charles Mingus, Dizzy Reece, Chris Connor, Bob Timmons, Andrew Hill, Pat Martino, James Moody, Gary McFarland, Oliver Nelson e Willie Bobo.
Na banda de Mingus, torna-se amigo do pianista Jaki Byard e participa de vários concertos e gravações sob a liderança deste. Também fez parte da célebre Thad Jones/Mel Lewis Orchestra, entre 1966 e 1969, e do quinteto de Elvin Jones, entre 1967 e 1970. Nesse período, já havia gravado alguns discos com Chick Corea e a afinidade estético-musical entre os dois era bastante evidente.
Farrell fez parte da primeira formação do Return to Forever, banda de orientação fusion criada por Corea, e permaneceu ali de 1971 a 1973. No início dos anos 70, ele assina com a CTI Records e seus discos obtém ótimas vendagens, especialmente “Moon Gems,” de 1972. No selo de Creed Taylor, ele se tornaria um dos artistas mais ativos do cast, marcando presença em discos de Don Sebesky, Eric Gale, Stanley Turrentine, Grant Green e Milt Jackson.
Seu nome passa a ser disputado não apenas na seara jazzística, mas também por artistas ligados ao rock, ao pop e ao R&B, como Laura Nyro, Roberta Flack, The Rascals, James Brown, Bee Gees, Darryl Hall & John Oates, Santana, Aretha Franklin, Carly Simon e The Band, a famosa banda que acompanhou Bob Dylan em alguns dos seus melhores trabalhos dos anos 60 e 70.
O saxofonista também participou de álbuns de artistas brasileiros, como Flora Purim, Airto Moreira, Luiz Bonfá e Hermeto Pascoal. Grande admirador do estilo de Farrell, o maestro Antonio Carlos Jobim fez questão de tê-lo em vários dos seus discos, com destaque para “Stone Flower” (CTI, 1970), “Tide” (PolyGram, 1970) e “Look to the Sky” (CTI, 1972).
A lista de músicos de jazz com quem Farrell trabalhou, como líder ou como acompanhante, é longa e eclética, incluindo aí nomes como Lee Konitz, John McLaughlin, Jimmy Smith, Freddie Hubbard, Paul Horn, Buddy Rich, Dave Holland, Ray Barretto, Buster Williams, Keith Jarrett, Joe Williams, Dizzy Gillespie, Stanley Clarke, Jack DeJohnette, Ray Mantilla, Stan Getz, George Benson, Herbie Hancock, Larance Marable e uma infinidade de outros.
Durante os anos 70, integrou os grupos do baterista Billy Cobham e do trompetista Blue Mitchell, excursionando e gravando assiduamente com ambos. Ele também fez parte da Mingus Dynasty durante o terço final daquela década, participou de diversos álbuns do ex-patrão Corea e montou um grupo com o baterista Louis Hayes. Embora fosse um músico bem-sucedido e sua agenda estivesse sempre lotada, Farrell tinha sérios problemas com o álcool e a cocaína, fatores que atrapalharam bastante sua carreira e que, em pouco tempo, lhe devastariam a saúde.
No início da década de 80, Farrell participou do supergrupo Fuse One. Criado pelo produtor Creed Taylor, o grupo fazia uma mistura de jazz com ritmos latinos, funk e pop e por sua formação passaram, entre outros, músicos consagrados como os guitarristas George Benson e Larry Coryell, os saxofonistas Stanley Turrentine e Ronnie Cuber, os baixistas Stanley Clarke e Marcus Miller, os pianistas Ronnie Foster e Victor Feldman, os percussionistas Paulinho da Costa e Sammy Figueroa e os bateristas Lenny White e Steve Gadd.
O grupo chegou a gravar alguns álbuns para o selo japonês King, mas a receptividade do público ficou bastante abaixo do esperado, ainda mais quando se considera os talentos envolvidos no projeto. Uma curiosidade é que o grande Wynton Marsalis, famoso por seu apego ao tradicionalismo, chegou a fazer parte da banda, podendo ser ouvido no disco “Silk”, de 1982.
Morando em Los Angeles desde o início dos anos 80, Farrell viu ali os seus problemas de saúde se agravarem, por conta do alcoolismo. As ofertas de trabalho começaram a rarear e durante aquela década o saxofonista gravou pouquíssimos discos em seu próprio nome. Além dos álbuns pela CTI, Farrell lançou discos por selos como Warner Bros., Xanadu, Contemporary, Timeless e Reference.
Em um dos seus raros discos da época, lançado pela independente Real Time, Farrell encontra uma lenda do jazz, o altoísta Art Pepper. Os dois homens compartilhavam um talento invulgar e uma vida pessoal pra lá de tumultuada, daí porque a interação entre ambos foi absoluta. Pena que Pepper atue em apenas três das oito faixas do álbum, mas sua presença é bastante para tornar esse disco um pequeno clássico oitentista.
A sessão rítmica é das mais experientes e conta com o pianista George Cables, o baixista Tony Dumas e o baterista John Dentz. As gravações foram feitas no dia 23 de março de 1982, em os Angeles, e a faixa escolhida para abrir o disco é uma criação do quinteto, chamada “Section-8 Blues”. Embora se assente na tradição do blues, o tema flerta com o bop contemporâneo, aproximando-se das composições oblíquas de um Wayne Shorter. Destaque absoluto para as inflamadas performances de Farrell e Pepper, que mostra aqui uma indubitável influência de Coltrane.
“Darn That Dream”, balada elegante de autoria de Jimmy Van Heusen e Edgar De Lange, recebe um arranjo minimalista, que privilegia a beleza algo fantasmagórica da melodia. A sonoridade adstringente de Pepper contrasta com a doçura do piano de Cables, seu pianista por muitos anos, com um resultado emocionante. Ótimas atuações de Dentz, com um magistral uso das escovas, e de Farrell, que honra a tradição baladeira do tenor e emula a abordagem sensível de Lester Young
Os dois saxofonistas estão na plenitude da criatividade em “Mode For Joe”, hard bop flamejante de Cedar Walton. Solos portentosos, ataques rápidos e bem articulados, fluência nas transições entre graves e agudos, uso inteligente dos efeitos, enfim, Pepper e Farrell duelam como se estivessem em uma animada jam session. Cables conjuga vivacidade e precisão, providenciando um acompanhamento impecável para que os saxofonistas possam brilhar com toda intensidade.
“Blue & Boogie” é bebop da melhor safra e leva a assinatura do pai fundador Dizzy Gillespie. Sem a presença de Pepper, Farrell se desdobra e consegue estimular os companheiros e encantar o ouvinte com sua sonoridade poderosa e seus improvisos surpreendentes. Todos os integrantes da sessão rítmica têm amplo espaço para solar, com destaque para a explosiva atuação de Dentz.
O quarteto emenda três standards em seqüência, sendo o primeiro deles a vibrante “You Stepped Out Of a Dream”, de Nacio Herb Brown e Gus Kahn, executada com uma curiosa levada afro-caribenha, com direito a uma rápida citação a “Stranger In Paradise”. “Someday My Prince Will Come” e “On Green Dolphin Street” ganham arranjos mais convencionais, mas em todos eles o brilhantismo e a excelência técnica de Farrell se sobressaem.
O encerramento fica por conta da feérica “Fun For One And All”, única composição de Farrell inclusa no disco. É um calipso sincopado e alegre, com uma excelente atuação de Cables e de Dentz. Mesmo em um contexto eminentemente dançante, o saxofonista consegue impregnar o tema com elevadas doses de bebop. O disco foi lançado no Brasil há alguns anos pela gravadora Trama.
Pouco mais de dois meses depois dessa gravação, Pepper morreria, em decorrência de um AVC. Farrell, que gravaria apenas mais um álbum como líder, ainda viveria mais alguns anos, vindo a falecer no dia 10 de janeiro de 1986, em Los Angeles, vitimado por um câncer ósseo. Em 2008, sua filha, Kathleen Firrantello, entraria na justiça contra os rappers Kanye West, Method Man, Redman e Common, exigindo reparação pelo uso não autorizado de trechos de um tema de autoria do saxofonista, “Upon This Rock”.
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O sol desatinado e poroso
Maldigo o sol minucioso da manhã
O sol que ecoa na lápide solitária
Maldigo a lua
A lua portátil e fugidia
Maldigo a lua que irrompe por entre as ramas
Maldigo a meteorologia
Quando chove e quando faz sol
Maldigo o silêncio convergente
Maldigo o efeito táctil do drama
Maldigo a polidez cartesiana do decoro
Maldigo a bifurcação do caminho, o rio que dá vau
Maldigo a geologia intacta da retina
Maldigo, maldigo sempre...
Não me impressionam os cálculos agônicos do servilismo
Não me impressionam os sintomas minerais da fleuma
Me causa espécie a serenidade contida,
Me repugna o ócio cultivado sob os dosséis de seda
Me quero livre!
Me quero fora dos círculos do comedimento e do recato
Me quero livre para cuspir na face da etiqueta
Por isso maldigo, agora, neste exato instante
Maldigo porque nunca pude romper os grilhões
Maldigo porque sempre me perfilei
Maldigo porque sempre honrei as convenções
Maldigo a transigência com aquilo que mais desprezo
O habitat castiço e mecânico em que vivo
Queria a incontinência
Queria a estupefação
Mas tudo o que fiz
Foi louvar os medíocres e os emplumados
Abracei a indignação apenas para desonrá-la
Por isso maldigo, neste instante congelado e vulgar
Submeti-me sempre às filigranas da linguagem
Maldigo-as, pois
Maldigo a todos, pela eternidade e adiante
Agora perdi o medo
Agora sou o eu que sempre sonhei ser
Agora posso escancarar-lhes a mediocridade
A putrefação do caráter
A ridícula troca de favores, o apadrinhamento, a hipocrisia
É noite e as janelas estão fechadas
Tomei o cuidado de verificar
Estou só...
Posso maldizê-los à vontade
Mas o faço em silêncio
Pois as paredes têm ouvidos...
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O saxofonista e flautista Joseph Carl Firrantello, nascido no dia 16 de dezembro de 1937, em Chicago, Illinois, teve uma vida bastante turbulenta. Aos 11 anos começou o aprendizado do clarinete, trocado, ainda na adolescência, pelo sax tenor. Aos 18 anos ingressa na University of Illinois, graduando-se bacharel em música em 1959.
Vivendo em uma cidade musicalmente estimulante, seus primeiros passos, como músico profissional, foram dados em clubes e boates de Chicago e arredores. Como dificilmente um sujeito chamado Joseph Firrantello conseguiria ir muito longe na carreira musical, o saxofonista adotou o pseudônimo de Joe Farrell, bem mais simples que o nome de batismo, e foi à luta!
Em 1960 resolve tentar a sorte em Nova Iorque e seu primeiro emprego foi na Maynard Ferguson Big Band, permanecendo ali até o ano seguinte. Em 1962 junta-se à banda do trombonista Slide Hampton, com quem mantém uma parceria de cerca de três anos. Concomitantemente, adquire bastante destaque ao participar, ao longo daquela década, de álbuns de gente como Charles Mingus, Dizzy Reece, Chris Connor, Bob Timmons, Andrew Hill, Pat Martino, James Moody, Gary McFarland, Oliver Nelson e Willie Bobo.
Na banda de Mingus, torna-se amigo do pianista Jaki Byard e participa de vários concertos e gravações sob a liderança deste. Também fez parte da célebre Thad Jones/Mel Lewis Orchestra, entre 1966 e 1969, e do quinteto de Elvin Jones, entre 1967 e 1970. Nesse período, já havia gravado alguns discos com Chick Corea e a afinidade estético-musical entre os dois era bastante evidente.
Farrell fez parte da primeira formação do Return to Forever, banda de orientação fusion criada por Corea, e permaneceu ali de 1971 a 1973. No início dos anos 70, ele assina com a CTI Records e seus discos obtém ótimas vendagens, especialmente “Moon Gems,” de 1972. No selo de Creed Taylor, ele se tornaria um dos artistas mais ativos do cast, marcando presença em discos de Don Sebesky, Eric Gale, Stanley Turrentine, Grant Green e Milt Jackson.
Seu nome passa a ser disputado não apenas na seara jazzística, mas também por artistas ligados ao rock, ao pop e ao R&B, como Laura Nyro, Roberta Flack, The Rascals, James Brown, Bee Gees, Darryl Hall & John Oates, Santana, Aretha Franklin, Carly Simon e The Band, a famosa banda que acompanhou Bob Dylan em alguns dos seus melhores trabalhos dos anos 60 e 70.
O saxofonista também participou de álbuns de artistas brasileiros, como Flora Purim, Airto Moreira, Luiz Bonfá e Hermeto Pascoal. Grande admirador do estilo de Farrell, o maestro Antonio Carlos Jobim fez questão de tê-lo em vários dos seus discos, com destaque para “Stone Flower” (CTI, 1970), “Tide” (PolyGram, 1970) e “Look to the Sky” (CTI, 1972).
A lista de músicos de jazz com quem Farrell trabalhou, como líder ou como acompanhante, é longa e eclética, incluindo aí nomes como Lee Konitz, John McLaughlin, Jimmy Smith, Freddie Hubbard, Paul Horn, Buddy Rich, Dave Holland, Ray Barretto, Buster Williams, Keith Jarrett, Joe Williams, Dizzy Gillespie, Stanley Clarke, Jack DeJohnette, Ray Mantilla, Stan Getz, George Benson, Herbie Hancock, Larance Marable e uma infinidade de outros.
Durante os anos 70, integrou os grupos do baterista Billy Cobham e do trompetista Blue Mitchell, excursionando e gravando assiduamente com ambos. Ele também fez parte da Mingus Dynasty durante o terço final daquela década, participou de diversos álbuns do ex-patrão Corea e montou um grupo com o baterista Louis Hayes. Embora fosse um músico bem-sucedido e sua agenda estivesse sempre lotada, Farrell tinha sérios problemas com o álcool e a cocaína, fatores que atrapalharam bastante sua carreira e que, em pouco tempo, lhe devastariam a saúde.
No início da década de 80, Farrell participou do supergrupo Fuse One. Criado pelo produtor Creed Taylor, o grupo fazia uma mistura de jazz com ritmos latinos, funk e pop e por sua formação passaram, entre outros, músicos consagrados como os guitarristas George Benson e Larry Coryell, os saxofonistas Stanley Turrentine e Ronnie Cuber, os baixistas Stanley Clarke e Marcus Miller, os pianistas Ronnie Foster e Victor Feldman, os percussionistas Paulinho da Costa e Sammy Figueroa e os bateristas Lenny White e Steve Gadd.
O grupo chegou a gravar alguns álbuns para o selo japonês King, mas a receptividade do público ficou bastante abaixo do esperado, ainda mais quando se considera os talentos envolvidos no projeto. Uma curiosidade é que o grande Wynton Marsalis, famoso por seu apego ao tradicionalismo, chegou a fazer parte da banda, podendo ser ouvido no disco “Silk”, de 1982.
Morando em Los Angeles desde o início dos anos 80, Farrell viu ali os seus problemas de saúde se agravarem, por conta do alcoolismo. As ofertas de trabalho começaram a rarear e durante aquela década o saxofonista gravou pouquíssimos discos em seu próprio nome. Além dos álbuns pela CTI, Farrell lançou discos por selos como Warner Bros., Xanadu, Contemporary, Timeless e Reference.
Em um dos seus raros discos da época, lançado pela independente Real Time, Farrell encontra uma lenda do jazz, o altoísta Art Pepper. Os dois homens compartilhavam um talento invulgar e uma vida pessoal pra lá de tumultuada, daí porque a interação entre ambos foi absoluta. Pena que Pepper atue em apenas três das oito faixas do álbum, mas sua presença é bastante para tornar esse disco um pequeno clássico oitentista.
A sessão rítmica é das mais experientes e conta com o pianista George Cables, o baixista Tony Dumas e o baterista John Dentz. As gravações foram feitas no dia 23 de março de 1982, em os Angeles, e a faixa escolhida para abrir o disco é uma criação do quinteto, chamada “Section-8 Blues”. Embora se assente na tradição do blues, o tema flerta com o bop contemporâneo, aproximando-se das composições oblíquas de um Wayne Shorter. Destaque absoluto para as inflamadas performances de Farrell e Pepper, que mostra aqui uma indubitável influência de Coltrane.
“Darn That Dream”, balada elegante de autoria de Jimmy Van Heusen e Edgar De Lange, recebe um arranjo minimalista, que privilegia a beleza algo fantasmagórica da melodia. A sonoridade adstringente de Pepper contrasta com a doçura do piano de Cables, seu pianista por muitos anos, com um resultado emocionante. Ótimas atuações de Dentz, com um magistral uso das escovas, e de Farrell, que honra a tradição baladeira do tenor e emula a abordagem sensível de Lester Young
Os dois saxofonistas estão na plenitude da criatividade em “Mode For Joe”, hard bop flamejante de Cedar Walton. Solos portentosos, ataques rápidos e bem articulados, fluência nas transições entre graves e agudos, uso inteligente dos efeitos, enfim, Pepper e Farrell duelam como se estivessem em uma animada jam session. Cables conjuga vivacidade e precisão, providenciando um acompanhamento impecável para que os saxofonistas possam brilhar com toda intensidade.
“Blue & Boogie” é bebop da melhor safra e leva a assinatura do pai fundador Dizzy Gillespie. Sem a presença de Pepper, Farrell se desdobra e consegue estimular os companheiros e encantar o ouvinte com sua sonoridade poderosa e seus improvisos surpreendentes. Todos os integrantes da sessão rítmica têm amplo espaço para solar, com destaque para a explosiva atuação de Dentz.
O quarteto emenda três standards em seqüência, sendo o primeiro deles a vibrante “You Stepped Out Of a Dream”, de Nacio Herb Brown e Gus Kahn, executada com uma curiosa levada afro-caribenha, com direito a uma rápida citação a “Stranger In Paradise”. “Someday My Prince Will Come” e “On Green Dolphin Street” ganham arranjos mais convencionais, mas em todos eles o brilhantismo e a excelência técnica de Farrell se sobressaem.
O encerramento fica por conta da feérica “Fun For One And All”, única composição de Farrell inclusa no disco. É um calipso sincopado e alegre, com uma excelente atuação de Cables e de Dentz. Mesmo em um contexto eminentemente dançante, o saxofonista consegue impregnar o tema com elevadas doses de bebop. O disco foi lançado no Brasil há alguns anos pela gravadora Trama.
Pouco mais de dois meses depois dessa gravação, Pepper morreria, em decorrência de um AVC. Farrell, que gravaria apenas mais um álbum como líder, ainda viveria mais alguns anos, vindo a falecer no dia 10 de janeiro de 1986, em Los Angeles, vitimado por um câncer ósseo. Em 2008, sua filha, Kathleen Firrantello, entraria na justiça contra os rappers Kanye West, Method Man, Redman e Common, exigindo reparação pelo uso não autorizado de trechos de um tema de autoria do saxofonista, “Upon This Rock”.
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16 comentários:
O poema é bem construído mr.Cordeiro. Parabéns! Quanto ao disco pergunto: quem é Joe Farrell???????? Eu mesmo respondo: um tocador de fusion, pop e outros rítimos estranhos, menos jazz. Gravou discos horríveis pela CTI, se meteu com Airto Moreira e Flora Purim e esse disco postado, mr.Cordeiro, classificado um dos piores, se considerarmos "Darn that dream" como um álbum de jazz. Art Pepper teria se arrependido de ter participado desse disco. Uma verdadeira "furada" para Pepper.
Sem mais conversas, não posso perder tempo com coisas sem importância. E, estais detonado!!!!
Eu sabia que a falta do Rivotril Plutoniano ainda ia causar uma reviravolta nesta cabecinha alienígena...
Esse disco é muito bom!!!!
Pode até ser que outras coisas dele, na CTI, não sejam lá essas coisas, mas o Farrell é um grande saxofonista - tenho discos dele com o Dizzy Reece, com o Jaki Byard e um monte de outros. Muita coisa boa!
Não dá muito bola pro Predador, Érico! rsrs
O som é muito bom mesmo!
Adorei as faixas postadas, a bela resenha e o indignado poema!
Abração!
Grande Fig!
Meu embaixador nas terras D'El Rey!
Esse disco é ótimo! Confesso que tenho apenas ele do Farrell comio líder e conheço bem pouco do trabalho dele na CTI, mas os discos que eu tenho com ele atuando como sideman são todos muito bons.
Valeu, meu amigo!
Mestre Cordeiro,
Dessa vez fico com o Predador, mas continuo com quem você admira.
Joe Farrell tem um som sem tempero, sem sal, muito chatinho. E esse disco em pauta, o qual possuo, ou possuía pois acho que já passei pra frente.
Um abraço.
Mestre Coimbra,
Acho que você anda bebendo muito martini plutoniano com o Predador. Daqui a pouco vai até dizer que sushi de polvo jupiteriano e churrasco de brontossauro marciano são mais gostosos que a nossa terráquea feijoada!!!!
Mas esse disquinho é muito bacanudo e rola muito aqui em casa. Já ouvi o Farrell em outros contextos e ele sempre deu conta do recado.
Grande abraço!!!!
Dear Gran Master Boss Érico,
Ouvi e conheci Giuseppe Firrantelo aka Joe Farrell no I Festival de Jazz de São Paulo, quando tocou no conjunto de Chick Corea. Naquela época, além do Jornal do Brasil, onde trabalhava, eu também redigia uma coluna de jazz no jornal Estado do Paraná, de Curitiba.
Por coincidência, duas ou três semanas antes do festival eu escrevera um longo artigo de página inteira sobre ele no Estado do Paraná. Quando soube que ele viria a São Paulo, mostrei-lhe o artigo ocupando uma página inteira e ele ficou abismado. Apesar de não saber português ficou impressionado com o longo artigo e disse-me textualmente que nunca saíra algo tão longo e com tanto destaque sobre ele em jornal algum. Por isso, depois traduzí o artigo para o inglês e ele agradeceu demais, parecia que ganhara a Mega Sena.....
Além do Giuseppe Firrantelo, outro que brilhou intensamente no conjunto do Chick Corea com solos brilhantes repletos de muitas idéias e swuingue avassalador foi outro "carcamano" - o trompetista Al Vizzuti, que durante anos foi um dos mais destacados solistas da orquestra de Woody Herman.
Keep swinging,
Raffaelli
Mestre Raffaelli,
Até que enfim alguém veio desempatar esta partida. Agora Farrell 3 x 2 Predadores!
Viu aí, seu Predador, viu, viu? Um músico que merece artigo de página inteira do mestre Raffaelli não pode ser só "um tocador de fusion, pop e outros rítimos estranhos, menos jazz".
Viu, viu, viu?
O licor venuziano tava batizado, lá lá lá lá lá.
O licor venuziano tava batizado, lá lá lá lá lá.
O licor venuziano tava batizado, lá lá lá lá lá.
O licor venuziano tava batizado, lá lá lá lá lá.
Mestre, se não for pedir demais, será que vc ainda tem essse artigo - é que de repente eu enriqueço a minha modesta postagem e ela já entra num remotamente futuro "Confesso que ouvi 2, a missão".
Grande abraço!!!!
Pela sua euforia, mr.Cordeiro, parece até que ganhastes uma "batalha mundial". Joe Farrell era tão medíocre que quando soube da generosa resenha de mr.Raffaelli "parecia que tinha ganhado a mega sena", nem ele acretitava. Bom, para encerrar polêmicas, evitando "jogar conversa fora", vou repisar o que sempre afirmo: cada um com seu gosto musical pessoal. O teor das críticas nunca será uma unanimidade, ela poderá ser feita de maneira correta ou não, poderá ser aceita ou não. Eu, por exemplo, não tolero esse álbum do Joe Farrell e ponto final.
Dear Gran Master Boss Érico,
Caramba,não poderia imaginar que a menção a um artigo que escrevi sobre Giuseppe Firrantello (como descendente de italianos, mantenho o nome dele de batismo) quase desencadearia nova batalha verbal entre nosso Boss e o companheiro Predador. Jamais teria essa intenção, mas espero que os ânimos não fiquem mais acirrados do que antes....
Dear Gran Master, esse artigo deve estar misturado aos mais de 15.000 outros que, por absoluta de espaço em meu micro apartamento, estão espalhados na estante que ocupa uma parede inteira do referido apê. Devido às obras intermináveis na minha modesta morada, como deve ter observado naquela noite em que vocês me levaram até a porta do apê, estão espalhados pelo chão uma infinidade de objetos e sacolas que impedem abrir as portas da referida estante. Assim sendo, data venia solicito aguardar algum tempo até que a bagunça totalmente desorganizada reinante em meu apê seja definitivamente removida.
Após remover essas dificuldades procurarei a referida matéria entre as demais que ocupam aquele lugar na estante.
Keep swinging,
Raffaelli
Mr. seu Predador,
Para acabar com esse seu mau-humor (será que o reveillon em Mercúrio não foi caliente o bastante? e as dançarinas de hula-hula jupiterianas, não estavam animadinhas?) vou deixar que você escolha o objeto da próxima postagem. Marque a opção desejada:
( ) John Zorn
( ) Anthony Braxton
( ) Larry Coryell
( ) Pharoah Sanders
( ) Tião Carreiro e Pardinho
Vote e concorra a uma passagem para Urano!
Mestre Raffaelli,
O Predador adquiriu as passagens para um animado cruzeiro espacial e queria passar o recveillon em Mercúrio, cercado de dançarinas de hula-hula jupiterianas.
Acontece que o cruzeiro não foi lá essas coisas e desdce então ele anda num mau-humor "brabo".
Já ameaçou até usar o detonador atômico!
Mas depois de ler a resenha sobre o John Zorn e ouvir o "Concerto para dromedário, harpa paraguaia e faca Olfa nº 2" do Hermeto, ele vai dar uma acalmada!!!!!
Quanto ao artigo, pode ficar tranqüilo - quando for possível, você me manda, ok?
Um grande abraço!
Não posso desempatar nada...porque sou uma ignorante que quer só "aprender"...
Gostei do poema. Faz bem desabafar! Eu cá também maldigo hoje mesmo uma série de coisas da vida! Já disse!
Mas Viva a Vida! Está implícito, eu sei...
Abraço amigo
Bem, eu gostei do Farrell...
Querida MJ Falcão,
Sua presença no barzinho é sempre motivo de alegria!
Obrigado pelas palavras generosas - vivemos em um mundo onde as aparências são, no mais das vezes, superestimadas e onde contestar os valores tidos como "corretos" é uma prática arriscada.
Mas nos resta o jazz e ouvir Farrell é sempre muito bom.
Um fraterno abraço, diretamente do Brasil!
Ih, rapá... de Joe Farrell não tenho nada, será q devo, será que eu não devo?... rsrsrs...
Tenta esse disco, meu bom Garimpeiro.
Tem um outro disco dele, com o Freddie Hubbard, que a crítica fala muito bem - Sonic Text (olha que coincidência) - mas eu nunca ouvi, embora o Allmusic dê quatro estrelas pra ele: http://www.allmusic.com/album/sonic-text-r179977
Abração!
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