O jazz deve muito a Billy Eckstine. Nos anos quarenta, passaram por sua orquestra alguns dos maiores músicos de todos tempos, muitos deles envolvidos com a criação e o desenvolvimento de um estilo que mudaria para sempre a cara do jazz e sepultaria, do ponto de vista estético, a inocente era do swing, que se encerrou, de fato, no dia 6 de agosto de 1945, quando a anti-rosa atômica dizimou 250 mil pessoas em Hiroshima. O mundo estava mais cínico e mais sombrio. O bebop era a tradução desse cinismo e a trilha sonora mais adequada para esse novo mundo – escuro, cruel e violento – que emergia após a Segunda Guerra Mundial.
Na orquestra de Mr. B atuaram, entre incontáveis outros, Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Lucky Thompson, Leo Parker, Art Blakey, Fats Navarro, Tadd Dameron, Kenny Dorham, Tommy Potter, Budd Johnson, Miles Davis, Gene Ammons, Hank Jones, Dexter Gordon, Wardeil Gray e John Malachi. Havia também por ali um saxofonista franzino, extremamente compenetrado para qualquer coisa que se relacionasse ao jazz, e que seria uma das principais referências do sax alto: Edward Sonny Stitt.
Nascido em 02 de fevereiro de 1924, em Boston, e quatro anos mais novo que Bird, Stitt lutou por muitos anos contra o epíteto de que seria um imitador de Charlie Parker. Sempre que tinha a oportunidade, afirmava categoricamente que o seu estilo já estava desenvolvido quando ouviu pela primeira vez a música de Parker. Aliás, quando Bird se achava impedido de atender a algum compromisso, geralmente indicava Stitt como a melhor opção para substituí-lo, o que pode ter contribuído para entranhar no pensamento geral a idéia de que o segundo imitava o primeiro.
Ouvindo-se as gravações de ambos, percebem-se as diferenças de estilo e, sobretudo de concepções harmônicas, o que permite concluir que Stitt, de fato, sempre buscou uma voz própria dentro do jazz, embora haja muitas semelhanças entre o seu fraseado e o de Bird. A melhor forma de constatar essa distinção é escutando o fabuloso tributo “Stitt Plays Bird”, de 1963, onde Sonny encara com muita competência e personalidade o repertório de Parker. A abalizada voz de Hank Jones confirma essa distinção. Para o longevo pianista, amigo e companheiro de Stitt em incontáveis gravações e concertos:
“Eu não creio que Sonny tivesse tentado copiar alguém. Sonny Stitt tentava apenas ser Sonny Stitt. Muitas pessoas o comparam a Charlie Parker, e é verdade que Sonny possuía a mesma destreza técnica que Parker, mas não acredito que ele tentasse imitá-lo. Quando eu fecho os olhos e lembro como era tocar com ele, as palavras que me vêm à mente são: absoluta sinceridade”.
Stitt começo seu aprendizado na música com o piano. Passou para o clarinete e se firmou como saxofonista alto, embora também tocasse sax barítono e tenor, instrumento que passou a usar com regularidade a partir do final dos anos 50. Sua primeira experiência profissional, em 1942, foi na orquestra de Tiny Bradshaw, de onde saiu para integrar a orquestra de Eckstine. Depois disso, Stitt tocou algum tempo com Dizzy Gillespie (1946) e fez suas primeiras gravações como líder nessa época, para a Savoy. Passou algum tempo na prisão de Lexington, entre 1948 e 1949, por conta do seu envolvimento com heroína.
Uma vez livre, gravou com Kenny Clarke e Serge Chaloff e formou um duo com o saxofonista tenor Gene Ammons, velho companheiro da orquestra de Billy Eckstine. Como líder, gravou com regularidade para selos como Prestige, Argo, Roullette e Verve. Nos anos 50 tocou com James Moody, Ella Fitzgerald, Clifford Brown, Bud Powell, J. J. Johnson e Eddie “Lockjaw” Davis, além de ter integrado o Jazz At The Philarmonic. Numa das viagens internacionais da famosa caravana criada por Norman Granz, Stitt presenteou o mundo com um álbum belíssimo.
Talvez fossem os ares de Paris, onde o disco foi gravado, no dia 18 de maio de 1959, com produção de Granz. Talvez tivesse sido a companhia estimulante e desafiadora de Oscar Peterson, um músico que está para o virtuosismo ao piano no mesmo plano que Sonny está para o sax alto. Talvez fosse o repertório de extremo bom gosto, inclusive com composições de Parker. O certo é que o disco “Sonny Stitt Sits In With The Oscar Peterson Trio” se inscreve, sem dúvida alguma, entre os três melhores álbuns da quilométrica discografia de Stitt (mais de 150 discos como líder e centenas de outras gravações como sideman).
Ray Brown e Ed Tighpen completam o combo e propiciam a Stitt e Peterson, dois dos mais brilhantes improvisadores do jazz, a segurança necessária para diálogos memoráveis e solos devastadores. Já dizendo a que veio, Stitt faz gato e sapato de “I Can Give You Anything But Love”, de Doroty Fields e Jimmy McHugh. Peterson brinca com as teclas em seu solo, mas na maior parte do tempo contenta-se apenas em acompanhar o desenvolto Stitt. A destacar, o sensacional trabalho de Tighpen e a introdução genial, a cargo de Brown.
Uma prova de fogo para qualquer saxofonista, “Au Privave” é executada com absoluta naturalidade por Stitt. Aqui se tanto se percebe que as comparações com Parker são pertinentes, do ponto de vista da fenomenal capacidade técnica de ambos, como se constata o quão injustas são as acusações de que Stitt era um imitador de Bird. A música flui, transborda, exala do sax de Stitt com bastante personalidade. É um grande músico tocando à sua própria maneira uma composição de um outro grande músico. E isso não é pouco. A luxuosa sessão rítmica se mantém discreta, certamente para permitir uma audição mais atenta ao trabalho de Stitt.
Em “The Gypsy”, outra das características mais peculiares de Stitt se evidencia: a do baladeiro passional, desbragadamente romântico, como se cantasse as suas próprias dores e desilusões amorosas. Há muitas semelhanças entre “I’ll Remember April”, de 1942, e “Copacabana”, de 1946, o que ensejou, inclusive, algumas acusações de plágio a Braguinha e Alberto Ribeiro. A versão da célebre composição de Gene de Paul acentua as semelhanças, graças à percussão de Tighpen, que imprime um certo sabor latino ao tema.
Stitt em estado de graça e Peterson possesso fazem de “Scrapple From The Apple” uma das faixas mais extraordinárias do disco. Não é improvável que os líderes desconhecessem a música de Luís Gonzaga, que nas décadas de 40 e 50 teve diversas composições suas vertidas para o inglês e, além disso, ambos tocaram inúmeras vezes no Brasil e gravaram diversas músicas de compositores brasileiros. A própria “Baião” foi transformada por Ray Gilbert, sem autorização do autor, no sucesso “Caroom pa pa”, gravada por Carmem Miranda em 1949. A versão demolidora engendrada por Peterson e Stitt tem algo de baião em sua estrutura, sobretudo durante o solo do pianista e os atalhos da música, mais uma vez, mostram que o sol inclemente da caatinga pode sim aquecer as enfumaçadas noites da Rua 52.
“Moten Swing” ganhou uma versão bluesy, musculosa, mas sem qualquer prejuízo ao seu contagiante swing. Em “Blues for Pres, Sweets, Ben & all The Other Funky Ones” Stitt homenageia alguns ilustres predecessores, fazendo uso do sax tenor. A atmosfera de blues é reforçada pela sessão rítmica, em especial por Brown. O solo de Peterson é magistral, com evocações a outro “funky one” de primeira, o imortal Duke Ellington, e a parte final, com um expressivo diálogo entre o piano e o sax tenor, é fascinante. Outro blues – “Easy Does It”, de Trummy Young e Sy Oliver – e novamente com Stitt no tenor, encerra o set, de maneira irretocável.
Existem edições em cd nas quais foram acrescidas três faixas (“Sweet And Lovely”, “I Remember You” e “I Know That You Know”), gravadas em Los Angeles, em outubro de 1957, com Stan Levey na bateria e Herb Ellis na guitarra. Infelizmente, a versão que possuo contempla apenas o set original de oito faixas. Não obstante, é um disco soberbo, apto a desfilar por horas a fio na vitrola de qualquer aficionado por jazz.
Sobre Stitt, diga-se ainda que em 1957 lançou o excelente “Sonny Side Up”, pela Verve, ao lado dos lendários Sonny Rollins e Dizzy Gillespie. Nos anos 60 e 70, manteve o ritmo frenético de concertos e gravações. Atuou por um breve período na banda de Miles Davis, acompanhou Art Blakey, Barry Harris, Art Pepper, Harry Edison, Paul Gonsalves e Booker Ervin. Também gravou um ótimo disco ao lado Zimbo Trio. Faleceu no dia 22 de julho de 1982, em decorrência de um infarto fulminante.
Quando se ouve o sopro de Stitt, a impressão que se tem é a de que ele pertence à raríssima estirpe dos encantadores de saxofone. Basta fechar os olhos e percebe-se “o instrumento ganhando vida própria, levitando num palco pouco iluminado, sob um comando mental distante, a tocar sozinho! Isso porque simplesmente não foi possível visualizar o músico na mecânica natural, na outra ponta do instrumento. E aí a imagem entra no foco nos reflexos cintilantes no corpo de um sax como um objeto alado”. E essa é a imagem que me vem aos olhos nesse exato instante, enquanto ouço novamente a lânguida “The Gypsy”.
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Post dedicado ao amigo Sérgio Sônico, que me chamou a atenção para essa espécie raríssima de saxofonistas, capazes de encantar o instrumento e fazê-lo tocar sozinho. A ela também pertence o grande Eli Lucky Thompson e uns pouquíssimos outros.
37 comentários:
Prezado ÉRICO:
Bela resenha, bela homenagem, bela escolha de gravação.
Stitt, "pareça" ou não com PARKER (em particular no domínio técnico do alto, que lhe permite um fraseado espetacular), é um dos grandes.
Parabéns, mais uma vez e como sempre.
Caro Mestre Apóstolo,
Concordo com você. Sonny é um dos maiores, sobretudo no sax alto. Não fica a dever prá ninguém.
Abração!!!
Ouvindo e aprendendo, seu Érico. Aliás, falta um elemnto: ouvindo, lendo e aprendendo...
Valeu a homenagem.
Prezado ÉRICO:
Em tempo e por justos motivos, incluir na maravilhosa constelação orquestrada por "Mr.B" (Billy Eckstine, o cidadão que citou a impecável frase = "se o Sinatra me der o dinheiro dele, eu lhe darei a minha voz" = e ouvindo as gravações de Billy Eckstine cantando, temos que dar-lhe boa parte de razão), a grande e inigualável SARAH VAUGHAN.
érico,
tuas resenhas sempre respeitando a música e o leitor...informações e observações no ponto exato...parabéns.
o parágrafo final é o exemplo patente de tua habilidosa arte de escrever e nos entreter...parabéns2.
e por último vai meu pedido...rs.
amplexossonoros e pacíficos
Sonny é grande. Tive um lp muito interessante do Sonny com o Zimbo Trio. Esse não foi abduzido - doei para um amigo colecionador de bolachas. Infelizmente não encontrei em cd. Será que existe?
De qualquer modo, pedirei ao amigo para digitalizar.
UAU! Sensacional!
Uau digo eu, embevecido com as ilustres presenças dos amigos Apóstolo, Sérgio, Pituco, Fig e Salsa.
Sejam bem-vindos.
Que bom que vocês gostam do Sonny - acho que ele sempre ficou muito à sombra de Bird (injustamente, creio eu) e não tem o prestígio que merece dentro do jazz.
Quanto à briga Mr B x Old Blue Eyes, sei não, o carcamano era do barulho!!!!
Seu Mr. Salsa, não conheço esse disco, só de nome, mas tenho muita vontade de tê-lo!
E seu Pituco e Fig, breve vocês receberão um mimo virtual.
Abração!!!!
Rs, rs, rs... Ora, cs acham q eu deixaria barato essa informação, Zimbo com Stitt? o disco está no Loronix, com alguma dedicatória ou alusão a mestre Lester, inclusive. E nos comentários alguém mata essa charada aí da editora do CD.
Bem, ouvir já dá, e é facinhho, ter o CD, aí já é uma tarefa mais complexa.
Ô Seu Mr. Sonic Boy,
E o link? Por favor, atendimento VIP e serviço completo, ok? (rs, rs, rs).
Preguiça de pesquisar...
Abração!!!!
em tempo:
http://loronix.blogspot.com/2006/09/zimbo-trio-e-sonny-stitt-sonny-stitt.html
o endereço do zimbo/stitt.
Valeu!!!!
Erico,
bacana!!! O Super Trio de Oscar Peterson com Sonny Stitt fazem um sonzão. Qualquer saxofonista de quem se diga que é parecido com Charlie Parker é simplesmente um super musico. Parker é o expoente maior do instrumento e da improvisaão jazzstica.
Pàrabens pelo excelente gosto e por ajudar a disseminar a "Arte Maior"(copyright by Apostolo). Alias o amigo Apostolo,um pesquisador incansavel do jazz, tem ja pronto,ou quase pronto,um livro sobre Charlie Parker. Não li mas ja gostei.
Abraço
érico,
só me resta agradecer e aguardar a ocasião de tão somente andar ao léu, no céu da vibração...rs(gil)
tô ouvindo o discaço...não há como não se render ao som de mr.stitt e oscar peterson...piramidal
ontem, coincidentemente, ouvia the master peterson com ella and mr.satch...as dance cheek to cheek...que tb curto à beça com miss sassy e mr.b(citado do lp acima).
é isso aí,
obrigadão
abraçsons pacíficos
Mestres Tandeta e Pituco,
Muito bom começar o dia com comentários de pessoas tão bacanas e queridas.
É isso aí - Stitt Rules!!!
E quanto ao livro do Apóstolo, estamos todos na expectativa, assim como da reedição do Glossário do Jazz, do Mário Jorge, que, ao que tudo indica, também deve voltar a circular em breve.
Ella & Louis - Mr. B & Sassy, que belíssimos duos (uma futura postagem, talvez?).
Abração aos dois!!!!
... É, seu San, e ainda tem outra nuvidade. Dentro desse teu texto-tratado teve algumas dicas de artistas q não conhecia. Até agora, pelo menos uma aquisição muito rara já fiz: "Tommy Potter's Hard Funk". Completamente fora de catálogo, amigo. E só vou lhe dizer + uma coisa, 3 estrelas é o K...! - complete a linha pontilhada.
Discaço, seu San, um dis-caço.
Abraços. Não canso de te agradecer.
Valeu, Garimpeiro de todos os sons.
Posso ficar no aguardo?
Abração!
belo post !
eu não me esqueço da versão de Scraple from the Aplle com a big band o Rob McConnell no disco Brassy & Sassy
Salsa,
o Zimbo Trio com o Sonny Stitt tá lá no Loronix pra ouvir -
http://loronix.blogspot.com/search?q=stitt&submit.x=0&submit.y=0
abs,
Valeu, Mr. Guzz.
Vou dar uma sacada tanto no Stitt quanto no McConnell (vou ver se acho no amazon).
Um fraterno abraço.
éRICO ,
Belíssima resenha . Agora ficou bem melhor ouvir o disco que já era muito bom sem as suas historietas. Com elas então ...
Abraços
Érico , se ainda quiser tenho o disco do Zimbo com o Sonny Stitt e só falar ...
Abraços sonoros ,
Valeu Mr. Edinho,
Aquele disco do Oscar peterson não consegui baixar de jeito nenhum - nem pelo rapidshare e nem pelo Pando - ficava dando uma mensagem de arquivo corrompido!!!!!
O do Stitt eu baixei do loronix, através do link que o Sérgio disponibilizou. Mas te agradeço a lembrança - e estou às ordens!!!
Abração e obrigado pela visita!!!!
Erico, quanto ao Tommy Potter q te falei lá encima, claro, sócio, rs., q irá.
Só procê ter uma idéia, foi ouvir e fazer capinha caprichada pra pôr na estante. Afinal, conheces como é facil se perder naquele ninho de marfagafo cheio de marfagafinho meu, né? Pode até ser q a raridade tenha supervalorizado a minha opinião, mas acho q não, o disco é bomzão mesmo.
Vê no link o time:
http://www.freshsoundrecords.com/record.php?record_id=4859
No allmusic não diz nada sobre esse álbum de 56. O outro q aparece, com a inclusão de bonustracks ao vivo é ainda mais difícil - ao menos no soulseek. Enfim, é papa fina sim, c vai ver.
Bravíssima resenha, uma das melhores q li sob sua lavra.Bem escrita e extremamente equilibrada na dose exata da informação, estilo e impecável descrição das interessantes minúcias do referido trabalho.Quanto ao disco do Stitt com o Zimbo, ele saiu em forma de cd por um pequeno selo.Diante da distancia de milhares de kms de meus alfarrábios não tenho a informação precisa por qual.Cheguei a conversar com 2/3 do Zimbo a respeito dele e guardavam profunda gratidão com Stitt pela simples razão: gostaram do sujeito “de cara”.O Lester me disse numa de nossas conversas q tem o referido cd.Ouvi apenas uma vez o disco para reter uma impressão mais forte.Destacaria apenas q o texto de apresentação,na contracapa do vinil, ficou a cargo de um dos meus professores de jazz - o publicitário e “papa no conhecimento do jazz” e considerado amigo Alberico Cilento.Até a volta.
Bela homenagem a Mr. B. E Parker é Parker, os outros são os outros.
Grande abraço, JL.
É de manhã, vem o ssol e abro a caixa de mensagens... Bem, aí encontro as alvissareiras boas novas do sócio Sonic-boy, as palavras sempre muito bem colocadas do enciclopédico Edú e Mr. Lester, dizendo tudo em uma única e lapidar frase.
Bem, senhores, só me resta agradecer e desejar-lhes um ótimo domingo. O meu já está ganho!!!!
Abração!
Som maneirissimo.
Amplexos fumegantes!
Valeu a presença, meu caro HYJ!
Amplexos fumegantes e fique na paz!!!!
Érico,
Novamente você "arrebentou". Sonny Stitt sempre foi um dos meus grandes favoritos, um músico especialíssimo que tocava qualquer música em qualquer tom.
Por ocasião da sua temporada no Rio, em 1979, tive oportunidade de conversar longamente com ele. Como todos sabem, entre suas façanhas, ele especializou-se em "massacrar" outros saxofonistas no palco, botando para correr, entre outros, Stan Getz, Johnny Griffin, Warne Marsh e Charlie Rouse. Disse-me que gostava de fazer isso para demonstrar que ele dominava seu instrumento como queria. Sua frase a respeito disso foi bastante clara: "They got all the praise from the press and the public, but when jazz improvisation was concerned I'd eat them all"....
Sonny bebia muito e aqui no Rio todas as noites "traçava" duas garrafas de vodka antes de tocar na Sala Cecilia Meireles, sem que em nada o afetasse musicalmente. A respeito do vício pela bebida, contou-me um curioso episódio que relatei na minha coluna semanal no jornal Folha da Estância.
Ele fôra contratado para tocar duas semanas em Londres, no extinto Ronnie Scott's Club, e aproveitou para fazer uma série de consultas com um hipnotizador inglês muito conhecido por curar o vício da bebida de inúmeros músicos. Assim falou-me a respeito do hipnotizador: "Fiz umas oito ou dez sessões de cura com ele, mas não adiantou nada porque não parei de beber e, pior ainda, ele passou a beber comigo".
Keep swinging,
Raffaelli
Mestre Raffaelli,
que alegria poder contar com a sua excelsa presença!!!! Seja muito bem vindo a esta casa que é sua!!!!
Salvo engano, outro grande copo era o Percy Heath, que adorava a cachaça brasileira e tomava quantidades bíblicas do nosso tradicionalíssimo aguardente (li essa informação em algum lugar).
O Stitt nunca foi um queridinho da crítica, como o próprio Stan Getz ou o Lee Konitz, mas tecnicamente é tão fenomenal quanto qualquer um dos grandes - a história de que ele detonou Stan Getz algumas vezes também é célebre.
E essa de levar o hipnotizador pro "mau" caminho é ótima!!
Fico muito contente com o seu retorno ao nosso convívio e faço votos de que você se recupere totalmente dos problemas na coluna (sei exatamente o que você tem passado, como disse no e-mail que lhe mandei).
Nós "colunáveis" sofremos uma barbaridade!!!!
Um grande e fraterno abraço!!!!!
Edu,
Embora poucos saibam, em face da nula divulgação na época, em 1990 eu, Alberico e Zuza escrevemos o livro "Guia do CD de Clássico e Jazz", da Editora Nova Cultural, de São Paulo.
Keep swinging,
Raffaelli
Mestre Raffaelli,
Não apenas tenho o Guia (foi o primeiro que adquiri, bem no comecinho dos anos 90) como ele me é extremamente útil até hoje.
Bem que poderia haver uma reedição, não é mesmo?
Se possível, ampliando a quantidade de verbetes (muita gente boa surgiu e/ou se consolidou de lá pra cá).
Ademais, nesses tempos de internet e possibilidade de compras on-line, seria muito útil a quem quisesse se iniciar no maravilhoso mundo do jazz e montar uma discoteca bem abrangente.
Abraços fraternos!
Prezado Érico,
O contato e a longa experiência que tenho e tive com donos de editoras ensinou-me que eles não têm o menor interesse em investir dinheiro em segundas edições de livros de jazz alegando que "jazz vende pouco no Brasil". Além disso,
quando editam um livro do gênero, pagam uma merreca (quando pagam).
Nesse sentido, tomo a liberdade de relatar um triste episódio ocorrido em 1989 (portanto, há 20 anos) ao ser chamado pelo diretor de uma conhecida editora de livros para acertar os ponteiros no sentido de eu escrever um livro sobre jazz.
Após duas ou três cansativas reuniões interrompidas a todo momento quando o telefone tocava, retomávamos a conversa até chegar aos finalmentes.
Ele explicou o que queria e chegamos a um acordo sobre o conteúdo da obra. Então, quando ele quis encerrar o assunto, disse-lhe que faltava acertar um detalhe importantíssimo: quanto pagaria pelo meu trabalho, seguindo-se este diálogo surrealista:
Ele: você não sabe ?
Eu: Não, não sei de nada, por favor explique.
Ele: Nada pagamos aos autores dos livros que publicamos.
Eu: Qual a razão ?
Ele: É assim que fazemos com todos, mas os autores serão beneficiado porque acrescentarão aos seus currículos uma obra da nossa editora, que é uma das maiores do país.
Eu: (irritado por sua desfaçatez encerrei definitivamente o papo): "Quando vou ao banco pagar meu condomínio, luz, gás e telefone, se não botar o dinheirinho na boca do caixa, ele não me dá os recibos e se lixará solenemente pelo fato de eu acrescentar ao meu currículo ter escrito uma obra para sua editora manbembe. Além disso, não trabalho de graça". Dito isto, retirei-me e nunca mais voltei lá.
É assim que algumas coisas acontecem neste país.
Keep swinging,
Raffaelli
Correção:
Mambembe e não "manbembe".
Keep swinging,
Raffaelli
Um triste episódio mesmo, Mestre Raffaelli.
Revela o descaso com que a cultura é tratada no Brasil.
O sujeito publica o livro, ganha dinheiro (porque ele não ia publicar sem ter certeza de algum lucro), ganha prestígio (é muito bom para uma editora associar seu nome a um símbolo de elegância e sofisticação como o jazz) e o autor fica a ver navios.
Assim é ótimo ser editor!!!
Um fraterno abraço!
Érico,
A propósito, o pior de tudo é que vários jornalistas (dois deles bastante conhecidos e reputados) tiveram livros publicados pela tal editora sem receber um único centavo.
Eles submetem-se a isso por pura vaidade, apenas para terem um livro lançado na praça e seus nomes serem divulgados na imprensa.....
É assim que determinadas coisas acontecem no Brasil.
Keep swinging,
Raffaelli
Fiquei curioso, Mestre!
Quem seriam esses pavões misteriosos (rs, rs, rs - não precisa dizer, não!!!!).
Abraços!!!
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